segunda-feira, 16 de junho de 2008

Urbanismo - visões de um engenheiro

Vigilância eletrônica. 1
Saneamento básico e pensamentos políticos. 2
Concessões e eleições. 3
Segurança predial 4
Arranha céus. 5
Água, esgoto e lixo. 6
Planejamento urbano. 8
Seminário IEP.. 9
Dois mil quilômetros de calçadas. 10
Planejamento urbano e responsabilidades. 12
Arquitetura e urbanismo racionais. 13
A arquitetura, urbanismo e o século 21. 14
Reconstrução civil 14
Orelhões e barreiras arquitetônicas. 15
As melhores cidades e Curitiba. 16
Conselho Histórico e Geográfico de Curitiba. 17
Velocidade. 18
Metrôs. 18
Pedestres e atropelamentos. 19
Violência urbana. 20
Festas explosivas. 21
Cidades seguras. 22
Impactos ambientais urbanos

Derrubar uma árvore, dessas que dizem que vão acabar, pode dar cadeia sem direito a fiança. O mundo vai desaparecer se a famosa Natureza perder mais algum exemplar arbóreo de nossas florestas. O mico leão saiu da mídia, afinal até em Santos poderíamos encontrá-lo em viveiro de um parque municipal, não deve ser tão raro.
O ser humano depende do equilíbrio das forças e vidas da Natureza para sobreviver. Descobriu essa condição da sua fragilidade, transformando essa questão em mote permanente da mídia. Infelizmente a própria Natureza não é preservacionista, além dos fenômenos que dizem serem causados pela ação antropológica, ainda temos vulcões e poderemos bater em outro asteróide ou cometa para desgraçar os habitantes desse planeta, que de estático não tem nada.
Os brasileiros, conscientes da importância das florestas que sobraram, e cobrem boa parte do seu território, criaram leis draconianas em defesa do que consideram “meio ambiente” a ser protegido. É crime, mais do que hediondo, infringir as leis ambientais. O difícil é delimitar esse espaço que poderíamos definir como sendo de crime ambiental, afinal, até ao defecar o ser humano estará alterando a biota. Somando-se a isso outras necessidades naturais veremos que somos todos criminosos.
Precisamos de leis ambientais com foco no ser humano. Se a Natureza muda, faz o que bem entende, precisamos, antes de mais nada, preservar-nos, pois se somos algo é a partir desta consciência que o universo existe para cada um de nós.
Vivemos em cidades. A concentração em aglomerações urbanas é um fenômeno irreversível. Quem pensa que o bicho homem (e mulher) quer viver no mato está muito enganado. Obviamente toda regra tem exceção, mas é fácil descobrir indícios de que o campo remoto, verde, pastoril e isolado é coisa de uns poucos enquanto milhões procuram as delícias das cidades, mesmo morando em favelas. Vale a pena analisar com mais profundidade as estatísticas da Copel, por exemplo. Dificilmente o número de ligações rurais será maior do que os abandonos, a perda de consumidores no campo.
Nosso mato é a cidade e nelas queremos viver. Temos leis? Que nos defendam de tudo e de todos. O que vemos? Se para qualquer obra no mato é preciso tanto estudo e discussão, por quê não fazer o mesmo em nossas cidades? O governo municipal pode, a seu critério, inviabilizar seus munícipes? Pode, a qualquer momento, inventar regras que alterem as condições históricas de sobrevivência da população de sua cidade?
Em Curitiba estamos vendo uma ação no mínimo arbitrária da administração municipal. Sem aviso prévio os espaços de estacionamento nas avenidas principais estão sendo eliminados, deixando muita gente em dificuldades, quando não inviabilizando suas atividades comerciais que dependiam da possibilidade do cliente parar em frente a seus estabelecimentos. É Justo? Os shoppings centers agradecem.
Precisamos de mais respeito, de estudos, de negociação. Não podemos nunca perder de vista o direito, no mínimo, à indenização justa quando a comunidade entende que precisa agir contra os interesses de alguma minoria instalada em suas fronteiras. Qualquer cidadão deve pensar e imaginar que um dia poderá ser a sua vez. A proteção do indivíduo é uma condição sagrada nos países mais desenvolvidos, livres e democráticos. Não queremos ditadores, seja quem forem.
O povo de Curitiba diversas vezes reverteu decisões de seus prefeitos graças à mobilização popular. Estranhamente, ou naturalmente, quanto mais à esquerda mais intolerante é a administração. Ninguém é dono da verdade, menos ainda tecnocratas instalados em seus escritórios querendo construir uma cidade à semelhança de suas taras. Por quê a administração atual entende que o trânsito de automóveis é tão importante?
Obviamente o tráfego dentro da capital é importante, a questão é como melhorá-lo sem transformar Curitiba num simples aglomerado de vias expressas, cortando a cidade como bem entenderem seus funcionários municipais.
Precisamos discutir tudo o que representar impacto ambiental, aquele que afeta o ser humano, que corta suas raízes, que inibe sua sobrevivência. Se existe algo que nos interessa é a sobrevivência do bicho homem / mulher.
Vamos exigir estudos de impacto ambiental sobre projetos que afetem a existência dos curitibanos?

Cascaes
28.2.2006
Responsabilidade urbana

As cidades crescem, mudam e certos problemas em potencial ficam despercebidos enquanto não explodem em alguma forma de tragédia. Nelas descobrimos, principalmente nos países mais atrasados, o desrespeito total e absoluto ao cidadão comum. Vale tudo, dane-se o indivíduo quando o interesse presumido da maioria assim o determina. O que se deve avaliar, contudo, é quem realmente manda, que parcela da comunidade estará sendo beneficiada com a truculência das autoridades, onde se pretende chegar.
As questões urbanas são perfeitamente ilustradas em nossas grandes cidades, para não falar de Curitiba, tida pela mídia como exemplo de urbanismo e talvez, comparando com o resto dessa terra que Cabral disse que descobriu, um grau relativo de relacionamento entre a administração municipal e o povo da capital. Realmente, muito foi modificado graças a debates eventualmente ferozes, contudo tivemos decisões absurdas e imperdoáveis, como a instalação da Renault em região que seria de preservação ambiental e a ocupação das áreas às margens de nossos rios e ribeirões.
Por quê? Tentando entender e ouvindo o que se diz “off record” descobrimos exemplos de como somos dominados, humilhados, explorados, se não roubados por determinados tipos de liderança que talvez continue existindo...
O direito à omissão é diretamente proporcional à ignorância do indivíduo. O resto é pura desculpa que, lamentavelmente, descobrimos numa quantidade assombrosa de pessoas, simplesmente covardes ou mal intencionadas, procurando nacos da carniça que os urubus deixaram e fazendo de conta que os problemas sociais não têm nada a ver com elas.
A questão em torno do estacionamento das avenidas principais da cidade lembra outros, não menos absurdos, que vimos em passado recente em nossa capital. O Prefeito ou algum preposto decide algo e pronto, tem que acontecer. Afinal o trânsito não pode parar. Podemos até lembrar a letra da música Construção de Francisco Buarque de Holanda onde dizia ao final de cada estrofe “Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”. O pecado mortal do pedreiro: caiu na rua, prejudicou a movimentação dos automóveis.
Afinal, qual é a prioridade, que diretrizes pretendemos ao construir uma cidade? Como imaginamos deva ser a cidade do futuro? Um montão de gente em seus veículos correndo para todo lado?
Curitiba está perdendo a batalha contra a descentralização. A Prefeitura dá alvarás sem considerar o impacto na vida sadia, valorizando apenas regras de urbanismo que leis do tipo “solo criado” desmoralizam.
Temos associações, institutos, clubes de serviço etc. Até quando essas entidades continuarão a discutir questões pouco importantes no desenvolvimento das comunidades em que se encontram inseridas?
Existem dezenas, centenas, talvez milhares de ONGs. Para quê? Para se aproveitarem de incentivos fiscais?
Inúmeros problemas graves poderão surpreender a população atual, ou seus descendentes. Devemos, podemos, somos obrigados a imaginar as conseqüências de uma megalópole nas nascentes de um rio como é o Rio Iguaçu, precisamos imaginar o que faremos se alguma epidemia de grande letalidade nos atingir, temos que reduzir a poluição aérea, precisamos substituir as favelas por vilas residenciais habitáveis etc.
Todos somos responsáveis a menos que sejamos idiotas. Podemos nos perguntar, o que estamos fazendo para corrigir eventuais equívocos da administração municipal, estadual ou federal? Vamos simplesmente continuar falando mal do governo? Temos propostas?
A discussão das alternativas e das decisões da administração pública é uma obrigação de todo cidadão que se sinta capaz. Dos outros, que continuem a torcer pelos seus ídolos e que brinquem de gente grande. Curitiba é um desafio que empolga e que ainda dá tempo para se evitar os problemas que vemos em outras capitais brasileiras, frutos diretos da omissão, da especulação imobiliária, da alienação de pessoas que agora pedem socorro em meio a enchentes, desmoronamentos, dengue, violência, engarrafamentos, etc.

Cascaes
28.2.2006


Metrô, resgate da saúde urbana

Vendo a cidade de Curitiba crescer, mostrando seus engarrafamentos e impondo à administração municipal decisões impopulares, prejudiciais a seus cidadãos que viram a cidade nascer e que agora se sentem prejudicados pelas restrições viárias, lembramos que nossa capital está perdendo um tempo precioso. Já deveria ter iniciado o projeto do seu sistema metroviário, elevado e/ou subterrâneo.
Estamos agora falando da capital paranaense a partir de 2016, não existe mais solução metroviária para menos do que isso. Por quê?
Um sistema elevado é complexo, caro, com altíssimo efeito sobre a cidade. Deve ser precedido de inúmeras pesquisas, muitas hipóteses de crescimento devem ser analisadas, tudo dependendo de especialistas altamente qualificados em trabalhos lentos e que precisarão ser discutidos com a população.
Definidos os trajetos deveremos escolher o tipo de equipamento, localizar instalações de apoio, operacionais etc. Felizmente existem muitas alternativas no mundo que poderão nos atender, valendo aí uma concorrência internacional com condições técnicas e econômicas pré-estabelecidas, para que se tenha a melhor oferta sem que a decisão seja afetada pelos tradicionais esquemas que os lobistas conhecem bem.
Feito o desenho, tendo-se uma coleção de decisões tomadas, vêm as experiências, os ensaios para definição do processo de corte, de perfuração dos túneis, impermeabilização, acessibilidade, concursos arquitetônicos etc.
Paralelamente há a necessidade de estruturação institucional. Tipo de empresa, participação do estado e da união, da iniciativa privada, são negociações delicadas que envolvem questões filosóficas, econômicas, estratégicas em todos os sentidos. A história do metrô de São Paulo mostra, por exemplo, a montanha de dinheiro que esse sistema recebeu a fundo perdido da União enquanto o metrô do Rio de Janeiro parou por efeito de restrições políticas que os governos federais sempre tiveram contra aquela unidade da União a partir da transferência da capital para Brasília. Assim é bom lembrar que a adoção de critérios espartanos é importante à medida que nos torna independentes de favores de um país que nos considera ricos e apenas fonte de dinheiro para a sustentação de outros, nem sempre tão responsáveis quanto o nosso povo do sul do Brasil. Aliás, vale a pena ver quantos metrôs estão em construção e ampliação no Brasil (onde e como) enquanto em Curitiba ignoramos essa possibilidade a que já temos direito, optando por um sistema de superfície, em avenidas que estão fazendo falta para o trânsito comum.
Não adianta colocar soluções impossíveis. A cidade de Curitiba não poderá retroceder para redistribuir seu trânsito. Por outro lado ela merece um sistema complementar de transporte coletivo urbano que diminua a poluição no centro, que torne a cidade mais segura, que devolva à cidade avenidas agora tomadas pelas canaletas.
No centro da cidade as atuais avenidas com os ônibus expressos poderão se transformar em jardins, parques, áreas de lazer ou simplesmente em pistas para uso dos automóveis. É uma discussão interessante, pois, com certeza, o automóvel é o principal elemento de agressão ambiental em qualquer cidade. É um veículo com uma tonelada de peso em média, transportando cargas eventualmente úteis, atropelando, ocupando calçadas, enchendo a cidade de estacionamentos, garagens etc. O povo comum, que usa o transporte coletivo, pouco se beneficia com essa condição de transporte enquanto que, se tivesse à sua disposição um metrô bem estruturado e com capilaridade em nossa cidade, complementado pelos ônibus, micro ônibus e táxis, formaria um sistema a que temos direito, afinal, qual é a contribuição do estado do Paraná à receita da União?
A primeira linha do metrô levará em torno de dez anos para entrar em operação, devemos começar já esse projeto ou logo estaremos desmanchando quarteirões para que o trânsito flua adequadamente. Acima de tudo, a qualidade de vida em Curitiba depende desse sistema para recuperar um padrão que perdemos há tempos.

Cascaes
5.3.2006

Frota pública

O transporte coletivo urbano e os sistemas metropolitanos têm imensos valores estruturais, urbanísticos, econômicos e sociais. Disciplinam a ocupação do solo, facilitam ou complicam a vida do cidadão comum, aquele que não usa o transporte individual. Pelas suas existências e configurações valorizam ou depreciam imóveis, enfim, são uma das bases de existência das cidades, principalmente quando esses pólos de concentração humana ganham alguma dimensão significativa.
A importância do transporte coletivo cresce também à medida que a poluição ganha destaque. Um ônibus pode substituir centenas de automóveis e ser construído e operado de modo a produzir um mínimo de poluentes, já o automóvel é um veículo aleatório, ao gosto e poder aquisitivo de seu usuário.
A qualidade do transporte coletivo é fundamental na atração de pessoas que poderiam, alternativamente, estar em seus carros. O conforto é fundamental a pessoas que têm a opção do automóvel assim como detalhes de acessibilidade implicam na capacidade de atendimento a pessoas portadoras de deficiências físicas. A segurança do sistema, a priorização dos carros, tudo deve ser concentrado no sistema coletivo para que as cidades possam usar de forma mais adequada os seus espaços. A utilização dos queridos carrinhos em transporte individual ou familiar custa caro para a cidade. A manutenção e ampliação do sistema viário é um dos grandes itens no orçamento de qualquer região urbana.
Precisamos, pois, investir no transporte coletivo e ele não deve ser pago exclusivamente pela receita de suas passagens. Assim como vemos nos sistemas de maior capacidade, onde o subsídio é explícito, para os ônibus é justo que se utilize parte da receita fiscal do município e do estado (no caso do transporte metropolitano) para a viabilização de um transporte melhor para o cidadão comum.
Na administração Requião, quando prefeito de Curitiba, implantou-se a frota pública. A mudança institucional (frota pública, pagamento por quilômetro, gerenciamento centralizado pela URBS etc) promovida àquela época foi exemplar e base do sucesso do sistema atual. Por motivos mal explicados a frota pública deixou de existir. Colocou-se na tarifa do transporte coletivo urbano custos que agora impedem seu aprimoramento sob pena de aumentos insuportáveis. Por quê não retomar essa proposta, acrescentando à frota privada a frota pública, mantendo a operação nas mãos das concessionárias existentes e daquelas que vierem a ganhar concessões?
O ônibus é um equipamento urbano capaz de aprimoramentos importantíssimos. Poderá ser bicombustível, por exemplo, usando a energia elétrica no centro da cidade e o óleo fora dela. Poderia ter ar condicionado e outros recursos, principalmente a favor da segurança dos passageiros desde que esses custos não pesassem nas tarifas. Parte do percentual colocado nas passagens como remuneração de capital poderia ser deslocado para o pagamento da frota pública, deixando para o poder concedente a decisão soberana da qualidade dos veículos, livrando os empresários dessa responsabilidade.
Em Brasília temos um governo pretensamente de “esquerda”. Existe uma oportunidade de ouro para abertura de créditos do BNDES para financiamento da frota pública. No comando do estado do Paraná o governador Roberto Requião saberia como conduzir a proposta de implementação da frota pública. Com o apoio dos prefeitos da Região Metropolitana de Curitiba poderíamos num prazo relativamente curto iniciar uma renovação da frota e ampliação do número de veículos, o que ofereceria um salto de qualidade ao sistema. É uma oportunidade única de se mostrar as virtudes do estado investidor, sem a criação de empresas estatais, sem atingir grandes interesses da iniciativa privada.
À época da administração Requião, num prazo curtíssimo, a URBS colocou 88 ônibus articulados em operação e já tinha feito concorrência para centenas de ônibus convencionais, ônibus com padrões de primeira linha. Lamentavelmente destruíram essa proposta no governo seguinte. Agora ela poderia ser retomada, amadurecida, experiente, capaz de apresentar condições melhores, pois naquela ocasião a prefeitura de Curitiba estava impedida de assumir empréstimos por excesso de endividamento.
A frota pública é uma alternativa que certamente dará à cidade de Curitiba e outras que entenderem seu significado um padrão de qualidade que estão perdendo. A decisão está nas mãos do governador (transporte metropolitano) e dos prefeitos que realmente querem aprimorar o transporte coletivo urbano das suas cidades.

Cascaes
22.4.2006

Educação urbana

O cidadão das grandes cidades tende a se transformar num animal egocêntrico e alienado. Nossos sociólogos poderiam desenvolver grandes trabalhos de mestrado e doutorado analisando o comportamento das comunidades urbanas. Comparando vilas, cidades e metrópoles entre si o pesquisador poderia avaliar as mudanças de comportamento, existindo aí uma enorme gama de cenários que deveriam ser estudados para melhor planejamento da educação, por exemplo.
Nada mais perigoso do que multidões. À medida que as pessoas se reúnem, transformam-se em rebanhos à disposição do líder mais atilado. As lógicas em torno do “macho alfa”, da fêmea dominante, a disputa pelo parceiro(a), a garantia de alimentação, tudo se transforma em atitudes que lembram os tempos mais atrasados da humanidade.
O progresso tecnológico impulsionou a humanidade para organizações complexas. Nelas as pessoas ainda trazem “softwares” das florestas, não houve tempo para uma reprogramação completa. Isso é perigoso à medida que promove conflitos selvagens, violentos. Agravando tudo isso agora temos o tráfico de drogas como vetor de degradação, isso sem falar nos crimes clássicos, de tão rotineiros já não despertam emoções.
Para as cidades encontramos profissionais que consolidaram artes e profissões. Urbanistas, arquitetos, engenheiros, administradores, economistas, médicos e outros criaram estruturas e serviços que já ninguém questiona. Existe uma lacuna nisso tudo, o sociólogo, o gerente da educação vendo as cidades e não simplesmente a aplicação de aulas de desemburramento.
Em Curitiba diversas universidades ensinam profissões, poderiam formar, discutindo entre si, ambientes de debates em torno da educação urbana, do ensino da cidadania e de avaliação de comportamentos que se tornam altamente perigosos a todos. Seria interessante ver esses especialistas produzindo análises e orientações objetivas sobre como educar para não termos feras em torno de um campo de futebol, ao volante de automóveis ou em disputas triviais de bairro.
As soluções talvez não recomendem a pacificação total, a castração de jovens ou coisa parecida. Quem sabe devamos refazer estádios onde indivíduos voluntariamente se disponham a lutar até a morte, como acontecia nos circos romanos. A estupidez é tão grande que somos obrigados a considerar casos extremos. A esperança, contudo, é que existam fórmulas mais sensatas de se conter a violência e de se canalizar a agressividade para atitudes positivas.
Além da agressividade existem outras características que precisam ser inibidas ou estimuladas. O sentimento de solidariedade é talvez o mais urgente, o que mais tem feito falta. Precisa crescer muito para que saiamos de simples festinhas de caridade para a solução real dos grandes problemas que nos afetam. A redistribuição de renda pela elevação dos salários mais baixos, o redimensionamento de costumes, a aceitação de limitações para que os menos favorecidos possam crescer é um desafio colossal numa sociedade que adotou o “Tio Patinhas” como paradigma de comportamento.
A mobilização para um comportamento mais eficaz dentro de nossas comunidades pode partir de clubes de serviço, associações, sociedades que pretendam realmente crescer eticamente. Existe um tremendo desperdício de tempo que seria melhor aplicado se todos fossem mais atentos aos dramas ocultos pelos ruídos das grandes cidades.
Temos organizações em formação. Estruturas para-militares estão nascendo em nosso país na esteira de incapacidades já aceitas de solução dos problemas nacionais.
Tudo afeta as cidades. Nelas encontramos um reflexo dos problemas que marcam o nosso país. Analisando o que vemos em nossas ruas e calçadas sentiremos as falhas de nosso sistema educacional, origem ou efeito dos problemas políticos e administrativos do Brasil. Imaginamos que nossos sociólogos estejam organizados e preparados para contribuir com segurança para a solução dos problemas brasileiros. O desafio é vê-los estruturados para a otimização desse trabalho. O tempo passa e os sinais de alarme estão denunciando questões graves que devemos resolver em breve sob pena de virmos a ser cidadãos de uma nação perdida, violenta, triste e sem esperanças.

Cascaes
3.5.2006
Curitiba é uma bela cidade

Dizer coisas óbvias também vale, mas a repetição é importante para que não se percam detalhes que podem passar despercebidos à medida que nos acostumamos com a situação. A capital paranaense nesses tempos de início de inverno ainda mostra uma profusão de cores que merece observação cuidadosa.
A cidade tem muitos parques. Nesses lugares encontramos passeios bem feitos, lugares para descanso, prática de esportes, segurança, estacionamentos, bares etc. Neles podemos caminhar sem medo de algum assalto, atropelamento ou queda em algum buraco. São ainda muito novos, contudo. Oferecem pouco sobre a cultura, a vida do cidadão comum e da história dos paranaenses.
Nas ruas encontraremos a cidade real, viva, bela ou feia, rica ou pobre, bem arrumada ou relaxada.
Curitiba tem ruas encantadoras, casas surpreendentes. Felizmente a capital paranaense ainda não atingiu um tamanho sufocante. Ainda preserva imagens delicadas, soltas, sem a beleza agressiva, quando existe, de prédios gigantescos, fechando os céus, arquivos de gente lembrando que a superpopulação da Terra poderá nos levar a saturações perigosas.
Andando pela capital aprendemos, entre outras coisas, a valorizar, por exemplo, os discursos apaixonados do nosso deputado, ex-ministro, Rafael Greca de Macedo. Poucas pessoas colocam tanta emoção ao defender sua cidade como o nosso querido deputado. Ouvindo-o assim como relembrando textos da nossa amiga e escritora Anita Zippin abrimos os olhos, procurando as mensagens subliminares, mensagens de prazer de viver aqui.
Nesses tempos modernos, acelerados na busca da coisa nenhuma e no esquecimento de valores clássicos, devemos recordar e apontar imagens que existiram durante muito tempo. Cenários que deixaram sentimentos fortes naqueles que têm a felicidade de existir o suficiente para saber quanto aconteceu nessa terra. É importante lembrar e registrar para que os mais jovens saibam da história de seus pais e avós, avós de avós, gente que veio para essa terra por opção e determinação, construindo aqui um lugar que se destaca nesse Brasil nem sempre respeitável.
Andar é preciso. Dizem os médicos que é saudável. Caminhar onde?
Devemos andar pela cidade.
Convém juntar motivos. Andar olhando as casas e seus jardins. Andar e ver também o trabalho infantil puxando carrinhos para coletar lixo. Descobrir idosos pedindo esmolas. Ver o rosto desesperado de gente que procura trabalho. Nesse contraste com as belas imagens descobrimos Curitiba, que vemos quando não precisamos olhar para o chão para não cair em algum buraco ou tropeçar em pedras irregulares, escorregar em pisos feitos por gente que não sabe o que é caminhar através da cidade, sentir o resultado de decisões desastradas de urbanistas empolgados com a beleza de seus desenhos, incapazes de enxergar a realidade de suas decisões.
Uma cidade do porte de Curitiba é uma enciclopédia e um documento vivo, demonstrando os efeitos de inúmeras opções que os brasileiros fizeram ao longo de sua história. A capital paranaense foi, por exemplo, tremendamente afetada pela decisão federal de erradicar o café nesse estado. Deram incentivos aos fazendeiros, esqueceram o trabalhador rural. Resultado: o êxodo rural, que na década de setenta do século passado levou à diminuição da população paranaense e ao inchaço de sua capital. Temos favelas antigas, lugares que os curitibanos procuram esconder dos turistas.
É bom andar. Caminhar pela capital paranaense é saudável à nossa cultura ainda que perigoso à saúde física. É acima de tudo didático, instrutivo. Essa é uma cidade que nasceu e cresceu reunindo influências e contribuições de muitas nações. Vem acumulando experiências que a tornam uma metrópole cosmopolita. Assim podemos ver como é nossa gente e o povo que o Grande Arquiteto do Universo escolheu para construir uma cidade que já tem muito a mostrar além de suas cores e jardins.

Cascaes
1.7.2006


Sistemas eletrônicos, segurança ou prisão

Não há limites técnicos para controle e monitoramento de qualquer atividade humana. A Engenharia e seus produtos viabilizam uma gama infinita de sistemas à espera de quem tiver visão e capacidade financeira para adquiri-los. Obviamente as limitações são as existentes em qualquer ambiente administrativo, capacidade para redigir, gerenciar e implementar contratos sofisticados, algo extremamente difícil de se encontrar num mundo que valoriza pilhas de papel em detrimento da capacidade de avaliação técnica e condução adequada dos projetos.
A evolução das máquinas fotográficas digitais é um exemplo ao alcance de todos. A qualidade e a capacidade dessas maquinetas superaram todas as expectativas, tornando a fotografia algo ao alcance de todos, só à espera de quem seja capaz de usá-las. Equipamentos existem, falta, contudo, malícia ou vontade real de usá-las de forma adequada. Na área policial o mundo tecnológico moderno seria extremamente útil. Algo, entretanto, emperra ações que poderiam ser mais eficazes, talvez a falta real de vontade política no combate ao crime organizado. Não fosse isso poderíamos perguntar como e por quê o tráfico de drogas é tão disseminado, acontecendo em qualquer lugar de nosso imenso país.
Felizmente a Polícia Federal está evoluindo, apesar das limitações provocadas pelo contingenciamento de verbas. Essa maldade, segurar recursos orçamentários para que sobre dinheiro para os banqueiros, é algo triste em nosso momento político-administrativo. Até quando?
Quem tem a felicidade de poder ver os programas policiais estrangeiros em sistemas de “televisão exclusiva”, a cabo ou satélites/antenas, deve ficar empolgado com os recursos de investigação das polícias e seus apoios nos países mais desenvolvidos. Catando detalhes e usando toda espécie de registro, crimes aparentemente insolúveis terminam desvendados e seus autores na cadeia ou executados (por quê não temos pena de morte?).
A eficácia dos sistemas eletrônicos nas cidades é algo que surpreende quando a administração desses pólos urbanos é eficaz e bem estruturada. Painéis dinâmicos criam interfaces com a população, sensores mandam informações que, processadas, orientam o tráfego, evitam acidentes ou criam restrições a favor da segurança da população. As infrações do trânsito são zeradas porque os radares e similares atuam em todas a principais avenidas, sem que os infratores sejam alertados do crime que pretendem fazer, ou melhor, sabem que sem perdão serão apontados pelos equipamentos pagos pelos contribuintes, pelos cidadãos pagadores de impostos.
Os índices de acidentes e de mortalidade são assustadores no Brasil, a criminalidade um problema que varia de intensidade, sendo maior onde a cultura da contravenção e das drogas estão consolidadas. Se em alguns lugares o crime é tolerado, noutros, talvez na maior parte do território brasileiro, seja vista com desconforto, medo, até raiva. Incomoda ver a liberdade das máfias e o carinho que se dispensa aos maiores bandidos, são autênticas autoridades que despertam medo e subserviência...
O progresso tecnológico não pára e o medo do terrorismo está induzindo as grandes nações a rever lógicas de vigilância.
De alguma forma as leis devem ser feitas e aplicadas para se evitar abusos, pois, como já o dissemos, não há limites para o policiamento se essa for uma diretriz forte de governo. Infelizmente a violência dos criminosos é um estímulo à adoção de ações de vigilância mais e mais invasivas.
Talvez, como alguns romancistas já o previram no passado, estejamos caminhando para uma sociedade policialesca a serviço de algum deus entronizado em palácios materiais, apoiado por exércitos de vigilantes super armados e sistemas ultramodernos de controle das pessoas.

Cascaes
2.3.2006


Transporte coletivo urbano

Serviços essenciais sujeitos a concessão não podem ser vistos como, simplesmente, atividade a ser explorada por empresas privadas. O povo não deve ser ingênuo e acreditar que o empresário atuará a seu favor. A prioridade de qualquer ser humano, qualquer que seja a sua condição profissional ou pessoal, é o seu interesse individual. Quando muito estará fazendo alguma caridade esperando compensação em outro mundo. Evidentemente existem exceções e elas merecem nosso respeito e admiração, deve-se, contudo, sempre partir do princípio do egoísmo, “defeito” natural do ser humano e de qualquer outra espécie viva. É uma lei da Natureza, simplesmente.
Com essas considerações chegamos ao transporte coletivo urbano. Onde é “explorado”, simplesmente, oferece, via de regra, serviços de péssima qualidade, tradicionalmente tão ruins que a população nem percebe, ou melhor, só aqueles impossibilitados de utilizar outros sistemas (individual, táxi, transporte coletivo de luxo etc) usam os coletivos comuns. A famosa competência da empresa privada acontece na oferta do mínimo possível de carros, trajetos mais rendosos, horários mais convenientes. Essas concessionárias sabem, usam e abusam do poder econômico para eleger políticos que defendam seus interesses e, via de regra, encontram pouca atenção dos demais. Aliás, raramente veremos os eleitos utilizando o transporte coletivo urbano, eles só aparecem nos terminais em época de eleição...
Curitiba é uma exceção, apesar de suas falhas. A qualidade do sistema deve-se ao modelo implantado na administração Requião, quando a URBS tornou-se concessionária e as empresas aceitaram ser permissionárias. O custo do sistema sob responsabilidade da URBS, que a partir daí, sob contratos, começou a pagar as transportadoras por quilômetro rodado permitiu um padrão de atendimento superior. Naquela época criou-se também a frota pública, lamentavelmente interrompida mais adiante. Com a frota pública a formação de capital seria em benefício do povo, que assim teria um custo menor a ser lançado na tarifa. Graças a ela foi possível a definição de padrões técnicos melhores (contrariamente ao que se pensa, não existiam padrões detalhados de lay out, por exemplo). A URBS, assumindo a fiscalização, teve condições de cobrar qualidade e na preocupação de servir melhor criar diversos sub sistemas, que fazem o orgulho do curitibano.
Tarifas maiores ou menores dependem de boa gerência, principalmente de maior atenção do Poder Concedente. Quanto os empresários deverão ganhar? Como? Sob que condições? Um relacionamento inteligente e honesto entre empresas e prefeitura permite a otimização de custos e aplicação de lógicas a favor do povo.
Vivemos uma época de idolatria pela iniciativa privada. Assim ganhamos a ALL, apagões, VASP, VARIG e custos crescentes. Se nossos governantes simplesmente optassem pelo combate à corrupção e tivessem mais cuidado com a nomeação de seus executivos, certamente a situação do Brasil não seria tão ruim quanto a existente agora pois as estatais que precederam essa fase neo liberal teriam melhor conceito, como é o caso da Copel. Lamentavelmente a apropriação do dinheiro público transformou-se num câncer generalizado. A “esperteza” de nossos líderes contaminou empresas públicas e privadas, não é privilégio de ninguém, infelizmente.
A nação brasileira é nitidamente dividida entre os ricos e poderosos contra o povo mais humilde. Ter muito dinheiro ou ocupar um cargo maior no serviço público significa apoiar-se em privilégios incríveis, próprios de feudos e monarquias passadas. Implicitamente vivemos em subordinações abjetas que, de tão antigas, não alertam nosso povo para as humilhações a que está sujeito na assimetria incrível das lógicas de julgamento e tratamento a que está submetido.
O transporte coletivo é um excelente exemplo e laboratório de todas as teorias que se possa desenvolver nas relações sociais de qualquer comunidade. Em Curitiba conseguimos implementar um bom modelo de gerenciamento, que já foi melhor quando a frota pública existia. Esperamos que o prefeito Beto Richa saiba valorizar o que se fez de positivo e compreenda que, se o sistema perdeu alguma qualidade, isso não foi por defeito do modelo mas pela falta de atenção de alguns delegados dos prefeitos anteriores.

Cascaes
22.1.2005
Indisciplina urbana

A qualidade do sistema de transportes coletivos urbanos de Curitiba deve muito à disciplina dos habitantes desta cidade. Graças ao respeito que sempre tiveram às regras do serviço, a cidade pôde utilizar veículos com portas largas, terminais de integração, bilhetagem automática etc. Se os curitibanos se comportassem de forma negativa a administração municipal seria obrigada a determinar a instalação dos sistemas restritivos, existentes em outras cidades brasileiras, alguns deles altamente desconfortáveis e agressivos com o agravante de que reduziriam a eficácia do sistema.
O vandalismo é um pesadelo. Talvez o operário, o cidadão mais humilde não saiba que é do salário dele que sai a conta para a recuperação dos estragos feitos por jovens mal educados e adultos imbecis. A cidade perde qualidade, enfeia-se graças a pessoas que poderiam usar melhor seus talentos “artísticos”. Esse é um mal universal, entretanto, merecendo teses de doutorado e ações mais eficazes. Sintomaticamente ele aparece com mais violência em dias de jogo de futebol, quando torcedores turbinados por ambientes agressivos se vingam nos bens públicos das frustrações causadas pelos “pernas de pau” que decidiram apoiar.
As empresas de telefonia e de energia conhecem bem os efeitos da agressividade covarde dos vândalos e nós certamente pagamos essas contas todo mês. De um jeito ou de outro o cidadão comum perde dinheiro com essa gente de mal com a vida.
A indisciplina urbana também aparece nas calçadas, praças e jardins.
Em Curitiba, não bastasse a péssima qualidade dos seus passeios, ainda os temos invadidos por automóveis cujos proprietários se consideram no direito de estacionar em locais dedicados aos pedestres. No bairro Vila Isabel, na fronteira com o de Santa Quitéria, por exemplo, lojas de automóveis usados são o lugar onde via de regra precisamos andar pela rua porque automóveis param acintosamente bloqueando as calçadas. Isso é mais evidente nas ruas secundárias, como acontece na esquina da Wenceslau Glaser com a Ulisses Vieira, onde sempre encontramos carros bloqueando o caminho que seria para os pedestres. O desrespeito chega aos pontos de ônibus, na Arthur Bernardes, um circuito de grande responsabilidade para a mobilidade urbana, é normal encontrarmos carros nos estacionados nos locais dedicados aos pontos de ônibus, agravando a fluidez e pondo em risco todos os que passam por ali.
Educação e policiamento é o remédio para essa doença. Pela segurança de vidros escurecidos, placas propositadamente rasuradas e até pela força física é no volante de automóveis que descobrimos indivíduos abusando de seus poderes. Seria até interessante que nossos ecologistas e ambientalistas se dedicassem mais ao efeito perverso do transporte individual. Na capital paranaense centenas de milhares de automóveis transportam algo em torno de um terço da população enquanto os dois terços restantes precisam apenas de menos de dois mil ônibus para as suas necessidades de locomoção. Lembrando a impermeabilização do solo com o asfalto, estacionamentos, fumaça, etc veremos que esses carrinhos, que eventualmente têm carga útil em torno de 100 kg, são responsáveis por uma altíssima dose de agressão ao meio ambiente. Tudo isso se agrava quando são mal utilizados...
As cidades vão se transformando na origem e fim do ser humano. Viver no mato é algo que os teóricos da reforma agrária defendem mas que não resiste ao primeiro aparelho de televisão ligado, quando a energia elétrica chega a seus barracos. A tendência é termos uma população residual vivendo longe das cidades, o resto convivendo, trabalhando, divertindo-se e outras coisas mais nos centros urbanos. Isso é natural pois o ser humano é um animal gregário, sedento de companhia.
Diante da necessidade compulsiva de viver em centros urbanos nada mais justo e lógico do que aprendermos a ter educação e respeito ao próximo. Para isso o maior responsável é o prefeito e o governador, um administrando a cidade, o outro cuidando da segurança, os dois decidindo sobre a educação.

Cascaes
11.6.2005

Qualidade do transporte coletivo urbano

Um pesadelo brasileiro é observar o desprezo pela qualidade dos sistemas de transporte coletivo urbano. Vamos a extremos, tendo-se em algumas cidades o que existe de melhor em sistemas metroviários e, na outra ponta, ônibus mal cuidados, pessimamente dirigidos, operados da pior maneira possível. Os usuários do transporte coletivo ainda têm o pesadelo de precisar caminhar em calçadas esburacadas, mal feitas, perigosas. Atravessar ruas é um tremendo risco de vida em cidades onde o excesso de velocidade só é inibido em espaços com radares devidamente sinalizados, alertando os infratores de que ali a irresponsabilidade deles será punida.
Com certeza este não deve ser o cenário de Curitiba, mas da grande maioria das nossas cidades.
Por diversas razões, talvez a principal aos eleitos, o fundamental é que o valor da tarifa seja o menor possível. O “vale transporte” criou um custo adicional para todos aqueles que têm empregados. Os empregadores têm automóveis, não usam os nossos ônibus. Reduzindo-se as tarifas, diminui-se o custo representado por esse benefício ao trabalhador.
Em Curitiba a opção pelo transporte individual se reflete na estabilização do número de usuários há muitos anos, apesar do crescimento da cidade. Grandes investimentos no sistema viário da cidade têm estimulado o curitibano a usar seus carros, estímulo reforçado pela insegurança, desconforto, freqüência ruim e tempos de deslocamento crescentes, pois as canaletas pararam no tempo e no espaço, desprezando os recursos mais modernos de ganho de eficiência.
No mundo mais racional o transporte coletivo urbano é subsidiado direta e indiretamente. O fundamental é que tenha qualidade suficiente para atrair o usuário do transporte individual. Procura-se evitar atitudes discricionárias, tendo-se na competição com o automóvel um indicador de qualidade importante.
Naturalmente a cidade precisa decidir o que pretende, mas também deve ser informada de forma completa e eficaz a respeito dos prós e contras de qualquer decisão. É comum em muitos países a decisão ser colocada em plebiscitos onde o contribuinte diz se quer ou não ver o dinheiro dos impostos que paga ser gasto nessa ou naquela área.
A polêmica em torno dos espaços de estacionamento nas avenidas centrais é importantíssima. Não deve ser apenas uma oportunidade de demonstração de autoridade, mas uma situação que deveria ser exposta à audiência pública. Fala-se tanto em impactos ambientais, esse é um caso mais do que justificável de se respeitar todos os procedimentos que se impõem a outros tipos de projetos. Nada mais justo que se exercite a democracia, a participação popular, nessa questão relativa ao congestionamento no centro de Curitiba, até porquê existem alternativas, ainda que, talvez, mais caras.
No caso das avenidas Visconde de Guarapuava e Silva Jardim pode-se discutir com mais detalhes a retirada do canteiro central. Alguns cruzamentos talvez pudessem ser evitados, assim como interferências transversais, onde com facilidade se criam obstruções ao trânsito. Obviamente algumas atividades são incompatíveis com a natureza dessas avenidas, como, por exemplo, acesso a escolas que poderiam oferecer outro lugar para seus alunos. Existe ainda a possibilidade de se estabelecer horários em que o estacionamento seria permitido. Ou seja, há muito a ser discutido. O que não é correto é, intempestivamente, a Prefeitura agir em prejuízo de empreendedores que lá instalaram suas empresas há anos, contribuindo para o crescimento de nossa cidade.
De tudo o que vemos, contudo, podemos concluir que Curitiba está ganhando engarrafamentos pelo abandono do transporte coletivo urbano. Deveríamos ter alternativas, soluções que agradassem a todos aqueles que precisam transitar pela cidade. Micros ônibus, veículos com ar condicionado, lay out mais confortável, mais segurança e capilaridade desviariam muita gente de seus automóveis, ainda mais quando o preço dos combustíveis cresce além da inflação. Paralelamente os taxistas deveriam ter incentivos e oportunidades para redução de suas tarifas. O táxi é um recurso excepcional, de grande valor, por exemplo para as pessoas mais velhas, portadoras de deficiências, freqüentadores de bares e restaurantes etc.
Há muito a ser feito antes de se atingir aqueles que trabalham e precisam de suas empresas para sobreviver.

Cascaes
25.2.2006



Metrô de superfície
A insensatez pode aparecer com as melhores intenções. Quem procura discurso e espaço na mídia arrisca dizer coisas diferentes, podendo eventualmente criar as bases para situações perigosas. Infelizmente nas emissoras de televisão, nos jornais e até nos partidos políticos encontramos o império da eloqüência, da verbosidade sobre a lógica. Leva quem falar mais, melhor, com mais convicção. Para o leigo que não gosta de pensar, basta um bom discurso ou algum afago para uma decisão que poderá mudar a vida dele próprio.
As questões ambientais tornaram-se espaço para todo tipo de irresponsável. Graças à mídia sem base e sem responsabilidade formou-se um suporte para todo tipo de maluco e chantagista. Chegamos ao absurdo de ver programas de televisão estigmatizando propostas de geração de empregos com expressões jocosas em cima da disposição de se criar indústrias. Alguém mais forte deveria perguntar para esses repórteres como recebem seus salários, de que forma se alimentam, quem faz os carros e microfones que usam.
A má informação não é privilégio de nossa época. Uma constante na história da Humanidade é a péssima utilização do conhecimento humano.
Entre as muitas questões colocadas ao discernimento popular encontramos as propostas para o transporte metropolitano, ou melhor, para o próximo sistema a ser adotado pela cidade de Curitiba. Tivemos o projeto do monotrilho sobre a BR 116. Poderia ser o primeiro segmento de um circuito perimetral, tal como é usado nas grandes cidades do Mundo. Infelizmente foi mal defendido, combatido porque não agradava especialistas e políticos que não foram capazes de enxergar Curitiba nos próximos vinte anos. A grande virtude desse sistema foi vista como defeito, ou seja, ser elevado.
No centro da capital paranaense convivemos com os ônibus dentro de canaletas. Na lógica da produtividade esses veículos transitam em grande velocidade, maior do que a razoável se considerarmos o peso e a manobrabilidade desses monstros sobre pneus. Ocupam espaços, geram poluição já superaram o número razoável em horários de ponta. Graças a eles, contudo, temos um dos mais baratos e eficientes sistemas de transporte do Mundo. O que precisamos observas, apesar do sucesso, é o risco de acidentes cada vez maior, e o potencial de aumento de capacidade de transporte. Devemos, agora, não havendo alternativas, procurar mais segurança com a adoção de medidas de apoio ao sistema.
As reações humanas são emocionais, não são lógicas. Os trens justificam cancelas automáticas, baixa velocidade. Para os ônibus basta a existência de sinais que eventualmente esquecemos de ver. Assim um amigo perdeu seu filho. Carlos Henrique Tiemechi Jr. foi vítima dessa lógica. Esse jovem estaria vivo se o sistema fosse subterrâneo ou elevado.
O metrô de São Paulo chega a transportar mais de 50 mil pessoas por hora e por sentido. Por quê? Trafega em túneis, pode atingir grandes velocidades, as composições são grandes e o sistema não conflita com o trânsito da superfície. É caro? Sim, ainda mais dentro dos parâmetros paulistanos, nem sempre sensatos e sérios. E aqui? Em Curitiba o sistema elevado, monotrilho, seria o sistema complementar ideal.
Tínhamos a proposta do aeromóvel. Por questões a serem um dia explicadas, não teve o apoio de Brasília nem dos petistas de Porto Alegre. Foi vendido para ser enterrado. Era de baixo custo, excepcional sob muitos aspectos, mas as comissões seriam pequenas e não possibilitariam viagens à França.
Assim enterramos nossos amigos, filhos dos nossos amigos e estranhos, mas gente que estaria viva se pudéssemos dissociar a política partidária do que a cidade precisa. Curitiba pode e deve iniciar a implantação de um sistema metroviário. Vamos rezar para que não seja de superfície, além de ser um blefe, com certeza matará mais amigos.

Cascaes
28.1.3

Responsabilidade urbana

O crescimento das cidades cria situações complexas, que exigem um padrão de educação intensiva para que as futuras metrópoles não se transformem em monstrópolis.
Talvez o problema mais grave seja o comportamento dos motoristas. No Brasil o pedestre é última prioridade, o automóvel, o caminhão, a motocicleta, a bicicleta, o patinete, o ônibus e qualquer outro veículo é conduzido como se a pessoa que estivesse à frente fosse algo para ser atropelado. Isso só não acontece mais porque suja o carro, amassa a lataria e até pode machucar seu condutor. Com raras exceções, e Brasília é uma delas, vemos nas cidades motoristas alucinados, esquecendo que o cidadão que anda pelas calçadas ou pelas ruas poderá ser deficiente visual, auditivo, mental, idoso ou uma ingênua criança.
Em Curitiba o ex-vereador Antonio Borges dos Reis está fazendo falta, não vimos ninguém assumir suas bandeiras com o entusiasmo que ele tinha. No Instituto de Engenharia do Paraná outra pessoa que deixou saudades foi o engenheiro Volmir Seelig, em seu tempo essas questões eram levadas a sério. Assim sentimos o esfriamento de lutas que já foram fortes, mas vencidas pela empáfia de alguns tecnocratas da Prefeitura e fora dela.
A responsabilidade do cidadão comum faz falta. Um exemplo notável é a manutenção das calçadas; feitas com padrões trogloditas, ficam piores pelo absoluto desprezo de quem deveria cuidar delas. Felizmente em Curitiba temos bons exemplos de passeios. Ciclovias e calçadas asfaltadas já existem em quantidade suficiente para alertar a todos nós pela péssima condição de outros trechos precários, abandonados, intransitáveis. Um bom exemplo é a Avenida Getúlio Vargas, re-urbanizada: em sua maior parte é excelente, mas no seu trecho oeste, próximo à Arthur Bernardes, é caótica, irregular, perigosa. Ironicamente, diante de um “educandário”, elas são tão ruins quanto no resto desse trecho, mostrando que nossos educadores ainda não chegaram lá.
Aliás, o drama das escolas está acima de qualquer nível imaginável há poucos anos. Muitas delas são dominadas por gangues juvenis, traficantes e bandidos de toda espécie. Principalmente nos bairros mais pobres há notícias de situações absurdas, criando a base para a violência agora e no futuro. O abandono das escolas de primeiro e segundo grau mostra que o Estado deveria concentrar recursos nesse setor, talvez cobrando anuidade dos estudantes que pudessem pagar nos três níveis. O Paraná poderia e deveria racionalizar o ensino em todos os seus níveis para poder gastar mais onde realmente é necessário. O resultado das fantasias poéticas de algumas lideranças é a tragédia social que vemos acontecer, afetando a vida de todos nós.
O Brasil mostra um processo de degradação acelerado. A mudança de trajetória exigirá decisões fortes, mudanças radicais.
Responsabilidade urbana é assunto sério, pois é atributo necessário em todos nós. Os loucos sempre existirão, mas muito da irresponsabilidade que percebemos deve-se à pura e simples ignorância associada à muita dose de agressividade que poderia ser tratada. Podemos e devemos, pensar na educação, no desenvolvimento das futuras gerações.
Nossos legisladores poderiam estudar a criação de uma cadeira com essa finalidade. Estariam reforçando outras leis, que pedem mais atenção para o que poderia se chamar de civismo e humanismo. Precisamos de gente com mais senso de urbanidade e respeito ao próximo, se o amor for impossível.

Cascaes
18.4.3
Hospitais, escolas e museus

Turista gosta de fantasias. A fascinação, que o viajante tem pelas coisas diferentes, motiva viagens e visitas incríveis. Em qualquer cidade famosa encontraremos guias dispostos a contar as baixarias dos poderosos e as razões de criptas e banheiros em castelos. A cultura inútil tornou-se um tremendo negócio. Eventualmente os lugares famosos apresentam lugares mais técnicos e infinitamente mais importantes para os visitantes. Em Paris existe a possibilidade de conhecer seus esgotos, uma obra de engenharia extremamente importante para aquela cidade. Com certeza atrai menos turistas do que a Torre Eiffel.
Inegavelmente a beleza é algo que encanta até o mais duro crítico. Como a Europa construiu suas cidades monumento não interessa tanto quanto a oportunidade de caminhar em suas belíssimas avenidas, vendo catedrais e palácios de toda espécie. Assim descobrimos onde foi parar o dinheiro das colônias e fortunas arrancadas de nações derrotadas em guerras provocadas pelas nações colonialistas. Ainda agora sentimos que a maior potência do mundo moderno invadiu o Iraque e causou uma destruição incrível simplesmente porque aquele país está sobre um mar de petróleo. Sorte a nossa de não termos essa riqueza nessa dimensão...
Por aqui construímos nossas cidades. No Brasil vivemos em condições resultantes de séculos de desprezo pelos mais humildes. Vemos a revolta dos grandes salários contra qualquer ajuste e notamos contra a nação deserdada e mal amparada a oferta de esmolas, angariadas em campanhas caríssimas e pouco eficazes.
Curitiba é cidade modelo. Com certeza muita coisa boa foi feita na capital paranaense. Resultado de uma série de bons governadores e prefeitos, é uma cidade com soluções atraentes. Apoiada em mídia exaustiva, tornou-se exemplo e até motivo de estudos como bom exemplo. Talvez não digam que o povo local lutou contra propostas mais caras e pouco eficazes, livrando Curitiba de despesas que teriam exaurido seu caixa há muito tempo.
As fantasias e a realidade poderão ser notadas comparando-se o último museu feito e as reportagens sobre hospitais e escolas degradados. Dezenas de pessoas já morreram neste ano só esperando internamento; UTIs que poderiam ter sido feitas com uma fração do que se gastava em museus, festas e propagandas caríssimos.
Existe uma alienação incrível na lógica popular. Parece que pensar dói. O comportamento lúdico é até saudável à medida que permite maior felicidade. Nesse sentido a idiotice poderá ser vista como um dom da Natureza, pois a felicidade é algo importantíssimo.
Podemos e devemos construir um Mundo melhor. Isso é possível desde que limitemos nossa alienação e tenhamos coragem e disposição para uma participação maior. Seria ótimo podermos viver num Brasil mais justo, naturalmente mais seguro e saudável. Nosso país é tremendamente rico em oportunidades. Se não é melhor é simplesmente pela falta de respeito ao próximo, herança de séculos de escravagismo recente. Talvez tudo isso tenha criado um sentimento fatalista, de omissão às questões sociais. Ditaduras e impérios não permitiram maior evolução política. Votamos mal, escolhemos pior.
O resultado de decisões que tomamos no passado é termos bons museus, praças e castelos bonitos, mas também favelas fétidas, milhões de desempregados, multidões dependendo do lixo das elites.
Curitiba conseguiu ser motivo de atenção até de cineastas estrangeiros, querendo fazer filmes sobre a cidade perfeita do futuro. Estamos no Brasil, temos defeitos, é perigoso acreditar que estamos bem. Aliás, não é segredo para nenhum curitibano que já precisamos andar de carro com os vidros fechados, que as cercas devem ser eletrificadas e que certos bairros são proibidos.
Teremos eleições em 2004 para prefeito. Precisamos desde já pensar em quem votaremos. Errar é humano, repetir o erro é burrice.

Cascaes
8.8.2003

Lixão da Caximba e outros

O “lixão da Caximba” está saturado. De acordo com o noticiário a Prefeitura Municipal de Curitiba já pensa em medidas extremas para ampliar o aterro sanitário onde o lixo de Curitiba é lançado. Ou seja, chegamos no limite apesar de todos os técnicos saberem que isso deveria acontecer agora. A saturação desse local é matemática, previsível. Sabe-se quanto é recolhido diariamente, a capacidade é conhecida, assim uma simples conta de multiplicar, de primeiro grau, já mostrava há alguns anos quando isso aconteceria.
No Instituto de Engenharia do Paraná fizemos dois seminários sobre o tema saneamento básico (anos 2000 e 2002), onde representantes da própria PMC afirmavam que o problema “lixão da Cachimba” era grave, havendo necessidade urgente de uma solução. Como tudo nesse Brasil, onde se prioriza problemas esotéricos e se esquece o imediato, o tempo passou e agora descobrimos no noticiário a situação de emergência. Nessas condições toma-se decisão em condições especiais, perdendo-se a oportunidade de soluções otimizadas, é lamentável.
O povo paga salários (políticos e funcionários) e serviços para ter uma boa administração pública em todos os seus níveis. O custo da máquina não é pequeno. Impostos, taxas, selos, carimbos e tarifas existem para tudo. Água, esgoto e lixo são (infelizmente) assunto municipal. Graças a fantasias de nossa Constituição Federal, compete aos municípios o controle desses serviços, criando-se situações complicadas.
A maioria absoluta dos municípios não tem condições de manter equipes técnicas capazes, sequer, de entender o problema, quanto mais administrá-lo, fazer os investimentos necessários etc. Entre cidades criou-se o conceito de que cada uma deveria resolver o problema dentro de seus limites. Felizmente, por enquanto, apenas em torno do lixo temos restrições fortes. Será interessante ver como será resolvida a questão, quando for levantada, de que o esgoto de cada cidade deverá ficar em seus limites.
Sem soluções decentes o saneamento básico transformou-se num pesadelo brasileiro. Ou melhor, em opção de trabalho para centenas de milhares de brasileiros que sobrevivem catando lixo nesse país de banqueiros e espertalhões. Assim vivemos, sem querer olhar, em um país naturalmente rico com problemas kafkianos onde o lixo que sobra da catação não tem lugar de depósito.
Temos leis severas, construídas à semelhança de outras de países ricos, desenvolvidos. Elas, contudo, têm base irreal. Pior ainda, são aplicadas num povo que não consegue entendê-las e vive num país estruturado de forma absurda. Criamos municípios que não conseguem pagar nem o salário do guarda do prédio da prefeitura e demos a essas unidades administrativas uma responsabilidade colossal.
Podemos compreender os desafios de uma prefeitura quando analisamos a situação do “lixão da Cachimba”. A capital considerada modelo, sede de um estado rico, deixa chegar ao limite a destinação do lixo que coleta. Podemos imaginar como outros problemas são tratados.
Em Curitiba existem inúmeras “universidades”, associações, clubes de serviços, entidades de todo tipo, e tudo isso somado não é capaz de ver de frente seus problemas. No lixo em que a cidade mergulha ficamos sabendo que até o início de outubro 39 pessoas foram assassinadas em apenas um bairro da cidade (Cajuru). Descobrimos nas suas ruas filas de carrinheiros e crianças desfilam pela cidade catando lixo. Favelas infectas são formadas ao longo de seus rios. E perdemos tempo e dinheiro brigando contra a soja transgênica...
O “Lixão da Cachimba” é um símbolo de nossa capacidade intelectual. Falamos difícil, gastamos fortunas com museus, queremos bondes e não discutimos questões essenciais à nossa sobrevivência. Não produzimos obras de arte para ocupar as paredes de nossos museus, quem usa o transporte coletivo cai em buracos de calçadas abandonadas e a cidade mergulha na violência total entre pessoas com fome, sede e frio.
Apesar de tudo, até que produzimos muito lixo (sinal de riqueza), só não resolvemos, ainda onde colocá-lo. Diante do que vemos, notando que os miseráveis sempre descobrem algo de útil em seus monturos, talvez pudesse ser doado ao “Fome Zero”, única forma que o Governo Federal encontrou de resolver a falta de comida de nosso povo, habitante de um país que produz quase uma tonelada de cereais por habitante por ano além de uma quantidade colossal de carne e outros alimentos (a maior parte exportada para pagar empréstimos desperdiçados).
Seria importante uma abertura de nossas consciências cívicas. Precisamos de menos ritual, menos palavras inúteis, demagogia e mais ação.

Cascaes
24.10.2003

Planejamento urbano

A mudança de governo nas prefeituras é sempre uma esperança de ajustes em prioridades, conseqüência do processo eleitoral e da renovação de lideranças e gerentes públicos. A democracia é um processo que se auto regula, tendo a tendência, em princípio, de aprimoramento da administração de nossas cidades, estados e da União.
Curitiba é uma cidade com uma tremenda responsabilidade. Por uma série de fatores é considerada exemplo para muitos lugares desta nação jovem e inculta. Neste cenário, tudo por aqui ganha uma importância nacional, podendo ajudar ou atrapalhar muitas comunidades.
Em nossas cidades, produto de comodidades e preocupações com a segurança, a utilização do transporte individual cresceu muito, situação também favorecida pela redução do custo dos veículos.
Ganha-se e perde-se diante de qualquer opção. O automóvel, principalmente, é o responsável por uma poluição tremenda. Gases, ruídos, atropelamentos, espaços, impermeabilização do solo, uma série de efeitos agressivos ao meio ambiente e ao ser humano podem ser apontados com facilidade, dispensando maiores pesquisas diante da evidência dos fatos.
O automóvel foi o principal vetor de desenvolvimento econômico de algumas nações mas chegou a um ponto de valor discutível. A situação é tão grave que grandes metrópoles, Paris é um exemplo eloqüente, começam a adotar estratégias de inibição dessas máquinas maravilhosas mas agressivas. Infelizmente a indústria e a mídia exploram a utilização do carro particular com apelos anti-sociais sutis. Mostrar que os carros atingem grande velocidade, que são símbolos de status, fora outros mais óbvios (Freud explica) é a estratégia comercial que, ao mesmo tempo, induz comportamentos nocivos a quem não os possui. O resultado, além da poluição e mortalidade no trânsito, é o esgotamento das cidades.
Em Curitiba menos de dois mil ônibus transportam, diariamente, ~70% da população da cidade, ficando os quase trinta por cento restantes com centenas de milhares de automóveis. Ou seja, a poluição causada pelo transporte individual, necessitando de asfalto, mais e mais viadutos, estacionamentos etc domina a cidade.
O transporte coletivo pode ser bom, confortável e ter preço razoável. Precisa ser prioridade e para o seu usuário não basta a qualidade dos ônibus, metrôs, bondes etc. A cidade deve ser segura para o pedestre. Além de monitoração e controle severo da velocidade dos veículos (individuais e coletivos) precisamos de calçadas, ciclovias, passarelas, abrigos e proteção contra a bandidagem crescente.
Sob responsabilidade da administração municipal, independentemente das leis que possam existir, existe a necessidade urgente de se adotar uma estratégia para construção de calçadas, que permitam caminhadas seguras, sem obstáculos e riscos desnecessários. A desculpa em Curitiba é a de que seria responsabilidade do proprietário do imóvel essa função. O resultado é que descemos de ônibus de excelentes padrões e caímos em buracos, quando não direto em ruas de anti pó, sujeitos a malucos ao volante.
Precisamos de opção clara, forte, inequívoca a favor do cidadão que anda, que utiliza o transporte coletivo, que deixa seu carro em casa. Evidentemente isso não agrada aqueles cidadãos que desprezam o indivíduo, que não tem suas facilidades. Com ou a favor dessa população menos atenta às dificuldades que criam ao utilizar veículos com uma tonelada de peso e uma carga média de setenta quilos nem sempre úteis, o prefeito precisa rever prioridades que Curitiba sempre desprezou. A capital paranaense descobriu muitas utilidades para os passeios. Lugar para banca de jornais, espaço de gramados para aumentar a permeabilidade, área para utilização de pedras irregulares. Precisamos fazer delas um lugar seguro para os caminhantes, jovens, idosos, portadores de deficiências, para todos aqueles que quiserem caminhar por essa cidade bela e nem sempre justa.

Cascaes
12.1.2005


Poluição

Diariamente vemos na mídia reportagens sobre a poluição. É assunto extremamente sério que se agrava à medida que as cidades crescem, muitas vezes cercadas de favelas (à beira dos rios) e indústrias de toda espécie. Em Curitiba, a famosa “capital ecológica”, podemos ver cenários paradoxais. A cidade prima pela limpeza de suas ruas, as árvores são intocáveis mas certos descuidos acabam comprometendo, e muito, a qualidade de um dos paradigmas brasileiros.
A multiplicação de favelas na Região Metropolitana de Curitiba é um sinal evidente do fracasso de muitas políticas e da indiferença com o próprio ser humano. O Brasil não conseguiu, após os tempos áureos do BNH, criar uma estratégia e apoio sustentado à construção de casas populares. A indigência das classes mais pobres trouxe de volta endemias e epidemias assustadoras além da violência urbana, que encontra nas favelas o local ideal para a comercialização das drogas, para o recrutamento de quadrilhas, guarda de seqüestrados, etc e etc... Seria altamente didático e uma punição à incompetência das elites brasileiras obrigá-las a passeios regulares pelas ruas dessas “repúblicas”, se bem que muitos de seus membros as conhecem pelas piores razões.
Ironias da vida, em Curitiba encontramos a Vila Pinto e seu ribeirão infecto cercados pela sede das federações (conglomerado FIEP), Tuiuti, PUC e Medianeira. Na PUC o restaurante dos estudantes é aromatizado pelas águas do ribeirão (rio Belém) que já teve a oportunidade de invadir as melhores instalações da Universidade. Talvez a situação da Universidade Católica seja didática, ilustrando para seus alunos o resultado da falta de atenção aos problemas sociais, urbanísticos e ambientais.
A poluição dos rios paranaenses é antiga. Há duas décadas sabia-se que o teor de mercúrio nos peixes carnívoros pescados nas águas da barragem da Usina de Foz do Areia já era maior do que o aceito pelos padrões dos países mais desenvolvidos. Estranhamente já não falamos dos agrotóxicos que dizem matar milhares de brasileiros anualmente, fora as deformações que produzem. Está na moda brigar contra as sementes geneticamente modificadas. Aliás, viajando com um desses ativistas institucionalizados senti que graças a isso ele tinha oportunidade de passear e fazer pose diante da imprensa. O drama brasileiro pouco lhe interessava, drama maior, a ausência de uma política consistente de saneamento básico, de segurança no campo, de saúde para os trabalhadores...
Coerência, prioridades e lógica são qualidades que não descobrimos com clareza na atitude de pessoas que poderiam corrigir rumos de nossa pátria. Existe o jogo político permanente, uma coleção de partidos e uma infinidade de ONGs pouco eficazes. O drama é que nosso povo mais humilde é tão pobre que lhe falta inclusive instrução para reagir às injustiças que sofre.
A poluição intelectual talvez seja uma das responsáveis pelo nosso atraso. Pessoas inteligentes acabam se perdendo no meio de um universo cada vez maior de situações, que exigem conhecimentos e discernimento para as melhores decisões.
O Brasil era um país com belíssimas expectativas de existência. Vinha, contudo, de um passado recente escravagista, genocida (extermínio das nações indígenas) e tremendamente inculto. O comportamento aristocrático de nossa burguesia importada e nacionalizada rejeitava o trabalho, a Justiça, a liberdade e a fraternidade, apesar de muitas sociedades e religiões pedirem o contrário. O espírito monárquico ligado aos comerciantes de gente produziu uma base ruim que até hoje polui nosso comportamento. Diante de tudo isso até que o mau cheiro de nossos rios seja uma mal menor...

Cascaes
6.6.2
Classificação de cidades

A evolução cultural dos povos permite cuidados que não se imaginava há poucas décadas. A Medicina em todas as suas formas oferece muito mais segurança que antigamente. Diante de tudo isso é possível e importante saber quanto nossos espaços urbanos são bons, saudáveis e seguros. Temos estatísticas, escalas e referências que viabilizam comparações importantes quando pretendemos optar entre um ou outro passeio.
Nas cidades todos os seus equipamentos urbanos e serviços de apoio são passíveis de qualificação.
Podemos começar pela criminalidade, quantos registros de assassinatos, roubos, estupros etc por ano? Para qualquer cidadão é interessante e fator de cuidados saber onde pisa, principalmente se estiver sujeito a agressões violentas.
Saneamento básico é outro fator básico de confiança. Sabendo que os prefeitos e governadores não gostam de investir em esgoto, por exemplo, pois não dá voto, precisamos encontrar formas de pressão para maior atuação nessa área.
Talvez poucos conheçam os índices de tratamento de esgoto das praias que freqüentam. Tomar banho com coliformes fecais alheios não é razoável mas é o que muitas crianças fazem, quando seus pais as liberam para banhos em praias poluídas. Cidades turísticas e famosas têm índices baixíssimos de tratamento de esgoto, será que seus visitantes sabem disso?
A enorme mobilidade humana atual cria facilidades para a disseminação rápida de doenças perigosas. A única maneira de se evitar a formação de epidemias é a prevenção. Além dos sistemas de combate direto (vacinação, isolamento etc) é importante manter os locais de maior presença humana tão limpos quanto possível. Coleta e tratamento de lixo e esgoto são dois fatores estratégicos na eterna guerra contra epidemias e endemias.
A educação no trânsito e a sensibilidade ao cidadão comum poderão ser medidas pela qualidade das calçadas, a sinalização para pedestres e motoristas, os sistemas de controle de tráfego. O trânsito mata e aleija de forma absurda em nosso país e isso precisa mudar. Uma boa forma será mostrar através de tabelas e indicadores a gravidade do problema, cidade a cidade.
Quando viajamos recebemos folhetos mostrando as maravilhas das praias, fazendas e demais pontos de interesse turístico. À semelhança do cigarro, essas promoções deveriam obrigatoriamente informar os índices de qualidade de vida, pré-estabelecidos nacionalmente de modo a induzir cuidados que não vemos existir.
Uma conseqüência do empobrecimento intelectual e material é a perda de visão dos problemas mais sofisticados. Naturalmente a fome, o desemprego, a insegurança generalizada aliadas ao culto ao individualismo afastam as pessoas de diretrizes mais complexas. Os partidos políticos no Brasil estão perdendo consistência ideológica e abraçando descaradamente o oportunismo demagógico. Os discursos de campanha apresentam teses vagas e atentas às pesquisas de opinião. Tudo isso é um alerta às lideranças informais para a necessidade de se criar instrumentos de pressão rumo a projetos eficazes. A mídia atende a tudo e a todos, pode ser colocada de forma sutil a favor do progresso quando empregada para dizer a todos nós, de todas as formas possíveis, com o máximo de detalhes, quais são os principais indicadores de qualidade de vida de cada bairro, cidade e estado. Talvez tenhamos surpresas ao constatar como alguns belos lugares estão infectados e mal cuidados.

Cascaes
3.6.2

Pisos de concreto

Terceiro milênio, novas idéias, problemas e soluções, o desafio de saber construir e viver.
O jornal da Associação Brasileira de Cimento Portland, informativo ABCP número 41 de agosto de 2002, traz uma reportagem sob o título “O mais econômico”. Esse artigo fala das vantagens do piso de concreto dizendo que estradas com piso de concreto reduzem em pelo menos 11% o consumo médio de combustíveis. Essa informação é oriunda de estudos realizados pelo Conselho Nacional de Pesquisas do Canadá, feitos sobre estatísticas comparando as diferenças de combustível gasto por caminhões trafegando sobre os dois tipos de pavimento (asfalto e cimento) no período de um ano. Esse artigo também afirma que nas temperaturas mais elevadas, típicas do Brasil, a economia seria maior.
Sob a visão energética deveríamos avaliar os efeitos nas cidades. O asfalto é um tremendo absorvedor de energia, liberando-a à medida que a temperatura ambiente diminui. Assim as cidades brasileiras apresentam temperaturas maiores em boa parte graças ao asfalto de suas ruas. Estima-se que as grandes cidades apresentam algo em torno de 5 graus a mais que a situação original. Para isso contam também todas as outras fontes de calor, que aparecem com a urbanização, mas, com certeza, os efeitos do piso pastoso e preto são significativos.
A cor escura do piso diminui também a eficácia da iluminação noturna. Desta forma gasta-se mais energia para iluminar as ruas e aumenta-se o risco de acidentes. Ruas e estradas são um pesadelo quando, à noite e com outros agravantes a iluminação falha.
Com certeza a necessidade de mais manutenção que o asfalto exige também agrava a insegurança das ruas e estradas.
Tudo isso, colhido rapidamente da memória e do artigo citado já seriam suficientes para ver com satisfação o empenho da ABCP na promoção do piso de concreto (cimento). Evidentemente existem enormes interesses comerciais, mas nesse caso pode-se tranqüilamente unir o útil ao agradável, que seria a redução de consumo de combustíveis fósseis, o aumento da segurança, a redução do consumo de energia elétrica e até os efeitos estéticos positivos de um piso bem feito de concreto. Note-se a importância da qualidade da execução do piso, mais exigente no caso do cimento.
O esforço da ABCP, graças à iniciativa do grupo Votorantin, soma-se ao das calçadas. Nesse sentido louvamos com entusiasmo a preocupação de mostrar às nossas autoridades (entre elas o vereador Marcelo Almeida, membro do grupo de calçadas) o significado de pisos bem feitos e seguros e a importância para o ser humano. A indiferença criminosa dos prefeitos ao trânsito dos pedestres é qualquer coisa de incompreensível. O Brasil se declara temente a Deus, cristão, rezador e se mostra incapaz de dar a seu povo um mínimo de dignidade, com raras e belas exceções.
Tudo mostra o valor da retomada da preocupação em torno dos padrões de urbanização. Os discursos de nossos políticos repetem antigas palavras de ordem, pouco acrescentam ao que já sabemos. Todos nós ficaríamos muito felizes se descobríssemos mensagens novas e mais objetivas, no intuito de melhorar a vida de todos nós, contribuintes e dependentes.
O terceiro milênio da era cristão será um período de grandes desafios. A sobrevivência das metrópoles e do ser humano em todas as suas atividades dependerá muito de prioridades diferentes das anteriores. A utilização de melhores tecnologias será vital à nossa sobrevivência. Nesse contexto as propostas da ABCP ganham força, e elas vão das casas populares às novas estradas, passando pelas boas e inteligentes calçadas. Vale a pena estudá-las com atenção.

Cascaes
17.9.2

Teses perdidas

Vendo reportagens de especialistas em urbanismo sentimos a derrota dos planejadores a favor da improvisação. Sob a desculpa de respeitar a liberdade do morador das cidades, os responsáveis pela administração dos núcleos urbanos aceitam qualquer movimento, contribuindo para transformar as metrópoles em monstrópolis, afinal, é mais fácil aceitar dos que renegar. Ganham, ainda, a admiração da mídia, sempre disposta a destacar o bizarro em detrimento da lógica.
O crescimento das cidades exige, apesar da omissão dos seus responsáveis, uma série de cuidados que os ambientalistas, tão ligados a questões distantes, deveriam ter como tema principal de suas lutas. Por quê?
Curitiba é um exemplo de problemas que podem ser base dessa tese. Começando pelo Rio Iguaçu, lá temos ocupações aleatórias em suas margens ilustrando o problema social de nosso país e os perigos em potencial. Casas improvisadas têm no rio o destino do esgoto e a fonte de água e de umidade que deve afetar a saúde de seus moradores. Essas favelas são lugares alvo para formação de quadrilhas de assaltantes e traficantes. Nelas os donos do crime organizado recrutam crianças e jovens para suas atividades, uma verdadeira universidade do crime comum. Outras favelas, em outros lugares, apresentam detalhes variáveis de morbidade, dando à capital paranaense o status de capital moderna, atualizada, dentro do contexto nacional de violência em todos os seus aspectos.
A cidade tem um péssimo quadro habitacional apesar de comandar uma Cohab e ser a sede da Cohapar. Quando foi a última vez que essas entidades receberam recursos para desenvolver seus projetos?
As grandes cidades apresentam também sintomas de desprezo pela vida humana entre os seus habitantes mais ricos. A velocidade dos automóveis, defendida irresponsavelmente pela maioria dos cidadãos, cria barreiras e acidentes. Esse desprezo torna-se evidente nos padrões de calçadas e a falta de cuidados com os passeios. Curitiba demora a criar um ambiente seguro e confortável aos pedestres, usuários dos transportes coletivos. Vale registrar que o a administração procura dinheiro para projetos caros mas não se dispõe a gastar quantias muito menores para dar aos seus cidadãos condições de caminhar pela cidade. Em troca liberou a construção de shoppings, onde encontramos tudo o que perdemos nos espaços abertos.
Felizmente aos poucos alguma coisa se recupera. As ciclovias mostraram aos prefeitos que eram boas calçadas. Assim outras ruas ganham passeios asfaltados, substituindo as tenebrosas pedras irregulares.
De vagar alguns cuidados com os portadores de deficiências aparecem. Pisos para os cegos, rampas para cadeirantes, sinalização mais legível e assim por diante. Novos abrigos para pontos de ônibus deverão proteger melhor seus usuários. Curitiba aos poucos vai chegando onde algumas cidades européias já estão há mais de meio século.
Urbanismo é algo que depende acima de tudo dos habitantes da cidade. Prefeito, vereadores e técnicos pouco farão se os seus habitantes não se interessarem pela qualidade da vida urbana. É fundamental a compreensão da necessidade de participação. Nesse sentido o Partido dos Trabalhadores está fazendo um excelente trabalho ao implementar o Planejamento Participativo. Aqui também tem havido esforços nesse sentido. Os resultados talvez frustrem mas o esforço é necessário. Para valer também deverá existir aceitação, humildade por parte dos técnicos que criam propostas. Talvez essa tenha sido a pior falha nas apresentações de que participamos, onde sentimos a postura até arrogante de alguns técnicos em seus momentos de exercício de poder, que não conquistaram nas urnas mas por delegação de políticos.
A vida urbana é complexa, fascinante à medida que dá a todos a oportunidade de participação. O resultado disso é a construção de cidades habitáveis, saudáveis, seguras. O contrário é mergulhar na violência, na degradação que descobrimos em cidades que antes eram maravilhosas, gostosas, bem feitas.

Cascaes
22.1.3


Vigilância eletrônica

Finalmente teremos na Rua das Flores um sistema de vigilância eletrônica. À semelhança, por exemplo, da Inglaterra onde centenas de cidades adotaram esse sistema há muitos anos, Curitiba inicia um processo tecnológico extremamente eficaz na inibição da violência. A tecnologia permite e os custos chegaram a níveis de terceiro mundo, por quê não usá-la? É bom lembrar que há quatro décadas, sob o comando do Dr. Marcos Prado, a capital paranaense instalou um sistema de vigilância do trânsito com equipamentos similares, sendo, então, pioneira dessa forma de controle. Lamentavelmente e de forma absurda esse sistema foi abandonado, apesar dos elevados investimentos. Muita gente teve enormes prejuízos e morreu pela liberdade gerada na falta desse complexo tecnológico. Naquela época a cidade teve câmeras e cabos instalados, sala de comando onde os aparelhos eram comandados à distância, tudo construído para oferecer ao centro de Curitiba um padrão de controle espetacular.
Uma das grandes razões de tanto sucesso dos “shopping centers” é o padrão de segurança. Neles pode-se andar com muito mais conforto, sem medo de cair em algum buraco, ser atropelado e agredido, roubado. Qualquer situação suspeita aciona esquemas de proteção camuflados mas altamente eficazes. Eles são a demonstração de que o ser humano comum não se incomoda de ser vigiado nessas andanças.
O medo é a ampliação desses sistemas de controle à vida privada.
Estamos à caminho do mundo super controlado. Já é possível rastrear qualquer indivíduo do nascimento à morte, basta querer e pagar o serviço. Qualquer espécie de sigilo poderá ser quebrado se os poderosos assim o desejarem. As multidões de nada servem sob os olhos de milhões de antenas. Pouco a pouco saímos do império das grandes religiões, que dos confessionários saíam para a conquista de almas ingênuas, para o controle sutil da vigilância invisível, administrada e usada por aqueles que puderem pagar seus serviços. E o pior é que temos de aplaudi-la quando sentimos o crescimento do crime organizado e da violência gratuita, típica das gangs, das tribos e da vida nas monstrópolis.
Curitiba, entretanto, está se disciplinando. Os famosos e mal falados radares são a única forma de inibir o excesso de velocidade. Mais uma vez usando o potencial da eletrônica a cidade procura domar seus malucos.
O terrível é que a má educação de muitos indivíduos leva à aceitação de mais e mais controles, radares e câmeras. Seria ótimo se as famosas campanhas educativas funcionassem, se bastasse dizer que a velocidade mata, que não se deve roubar, que o bom comportamento vale a pena. Diante da estupidez de muitos, burrice que se manifesta até na absurda exploração de alguns sobre muitos, acabamos dependendo de sistemas eletrônicos de vigilância. Que pena!

JCC, 2/7/2000

Saneamento básico e pensamentos políticos

Os baixos salários, o desemprego e a miséria intelectual, moral e política matam. Não desenvolvendo os serviços de água, esgoto e lixo, 29 brasileiros morrem por dia em conseqüência de doenças provenientes das más condições ambientais. A Folha de São Paulo trouxe em extensa reportagem de 16 de julho uma análise da situação brasileira. É uma radiografia do Brasil. Mostra dados e fatos de uma realidade que salta aos olhos mas não comove as elites dominantes. E as elites dominantes não são apenas aquelas que Marx diria serem proprietárias dos meios de produção, são elas e uma terrível casta de profissionais de nível “superior” que poderiam agir com mais firmeza e honestidade a favor do povo. Esse conjunto de indivíduos, onde os piores provavelmente serão esses engenheiros, administradores de empresas, economistas, sanitaristas e outros diplomados, que pouco fazem para uma mudança de rumos em nosso país, mantém o povo brasileiro em baixíssimo nível sem necessidade, há como resolver esses problemas.
Trabalhei um tempo junto a uma empresa de água e esgoto. Vi com muita clareza as prioridades de seus funcionários, responsáveis pela condução e ações da empresa. O corporativismo e a alienação total em relação aos objetivos da companhia faziam com que ela perdesse recursos valiosíssimos, absolutamente necessários em uma cidade que praticamente não tinha serviços de tratamento de esgotos.
A escravidão causou muitos males à cultura de nosso povo. O desprezo pelo ser humano era inerente àquele “processo de produção”. Quem mandava considerava natural e absolutamente necessário explorar o africano e seus descendentes no Brasil. Criou-se uma cultura de identificação do trabalho com a escravidão, era feio trabalhar. Pior ainda, infinitamente pior foi imprimir na cabeça dos brasileiros a lógica da exploração ao extremo de seres humanos. Assim entramos no século vinte com a cultura que a Princesa Izabel não acabou assinando a Lei Áurea. Na miséria que continuou a existir vieram as favelas, nossos guetos brasileiros. Nelas hoje vivem milhões de brasileiros, abandonados pela democracia das elites. Sem dinheiro, sem emprego (inempregáveis como diria FHC), como esse povo pagará serviços de água, esgoto e lixo? Aliás, do lixo muitos tiram a própria sobrevivência e nas águas poluídas seus filhos se divertem.
Saneamento básico, preservação de mananciais, ecologia, lindas propostas mas a principal é a formação de um povo com a dignidade de um salário mínimo suficiente a suas necessidades básicas. Um presidente sociólogo, mostrando cinco dedos da sua mão foi eleito nessa esperança. Infelizmente ele modificou o desenho da palma da mão, mandando uma sonora banana ao povo, sonora pois pediu candidamente que os brasileiros esquecessem seus discursos. E foi reeleito, incrível!
Voltemos à merda concreta. Os investimentos em saneamento básico estão diminuindo. As autoridades econômicas aproveitam o garrote da muito justa lei de responsabilidade fiscal para impedir novos empréstimos a empresas que via de regra usaram muito mal o dinheiro recebido. Impõe-se a privatização acelerada, a formação das agências reguladoras, o aprimoramento do Poder Judiciário na vigilância das concessionárias, a criação de uma nova mentalidade de responsabilidade social.
Aliás, precisamos de uma lei de responsabilidade social. Seria interessante se nossos legisladores desenvolvessem alguma lei que penalizasse duramente o prefeito, governador e presidente da República que ao final de seu governo tivesse piorado os índices sociais sem o argumento de alguma catástrofe. Fazem e aprovam tantas leis, precisamos apenas desta, que os eleitos realmente cumpram suas obrigações mais importantes, a de melhorar a vida do povo brasileiro.

JCC, 16/7/2000

Concessões e eleições
No processo eleitoral, diante da privatização das empresas concessionárias de serviços públicos, seria oportuno e importante a discussão das concessões e permissões dadas pelas prefeituras. A formação de agências reguladoras, a exemplo do que temos em Curitiba nas funções da URBS, é algo que nossos candidatos teriam que estudar, entender e aprofundar.
Os municípios regulam muitos serviços importantes. Da água aos cemitérios, os prefeitos são responsáveis pela vigilância da qualidade às tarifas. Essas informações deveriam existir em relatórios técnicos regulares.
Todas as concessões são objeto de contratos e muitas delas o resultado de licitações. Quando e como foram feitas? Qual é a lógica e contrato estabelecido para a cobrança de tarifas? Quem fiscaliza a qualidade dos serviços?
O custo e o sacrifício de usar os serviços públicos poderão ser um benefício e prazer. Tudo dependerá do que a comunidade for capaz de estabelecer, cobrar e pagar.
A qualidade é regulável, tem preço e elementos técnicos que bons engenheiros, arquitetos e até sociólogos saberão estabelecer de forma científica. Água, por exemplo, qual seria o compromisso da Sanepar? Como e em que escala seria medida a qualidade da água em cada bairro, nos principais pontos de consumo de Curitiba? E o esgoto? Quais seriam as metas? Que penalidades a concessionária terá se não cumprir suas metas?
O mais incrível em nossa sociedade é a falta de atenção para a possibilidade de regulação dessas concessões. É mais fácil falar mal delas do que exigir e estruturar a fiscalização de suas obrigações. Em Curitiba já existem muitas escolas de engenharia. O CREA tem sua sede estadual aqui. Não deveria estar cobrando informações? Na defesa do exercício da profissão estaria gerando postos de trabalho ao se posicionar de forma enérgica diante da atuação das empresas concessionárias.
E os economistas e sua entidade de classe não seriam responsáveis pela cobrança cívica dos demonstrativos contábeis e financeiros das empresas detentoras do direito de explorar os serviços públicos na capital paranaense? As planilhas das tarifas seriam um prato cheio para a realização de serviços a favor de nosso povo.
As eleições municipais serão uma excelente oportunidade de reflexão sobre esses serviços. Na cobrança das responsabilidades dos políticos, nossos líderes classistas, nós mesmos deveremos perguntar diante do espelho se temos colocado nossos poderes de participação de forma adequada. A responsabilidade não é pequena. Na qualidade da água, esgoto, transporte coletivo e outros serviços municipais muito poderá ser feito a favor de um melhor padrão de vida de nosso povo.
JCC, 9/7/2000


Segurança predial

Curitiba cresce, acumula prédios a cada dia mais velhos e o potencial de acidentes em seus edifícios aumenta.
Um aspecto freqüentemente desprezado é a deterioração de instalações. Matematicamente tudo está em permanente transformação. A Natureza é dinâmica. O que chamamos de envelhecimento é a preparação para outras formas ou, quando menos, um retorno às origens. Instalações de ferro, produtos orgânicos, metais puros tendem aos óxidos primários, aos compostos de onde foram extraídos. A questão que nos afeta é que não pretendemos voltar ao pó tão cedo. Assim precisamos zelar pela segurança.
Na Engenharia esse é um caminho que gera serviços. O profissional nessa área aprende a avaliar situações em que as leis naturais imperam. Médicos de máquinas e instalações devem saber, entender e corrigir eventuais desvios. O uso adequado desses profissionais e seus técnicos aumenta a segurança de nossas cidades, salva vidas e reduz custos.
Os responsáveis por condomínios, prédios e instalações comerciais e industriais devem estar atentos a mudanças drásticas de condições de utilização, à idade de seus equipamentos, às condições de manutenção. Tudo e todos têm limites e prazos para verificações preventivas. Instalações elétricas, por exemplo, merecem verificação imediata quando sinais de óleo, mudança rápida de coloração, ruídos diferentes ou cheiros de queimado aparecem. Para um bom profissional saber identificar cheiros, usar de forma adequada o tato e a audição dizem muita coisa.
Graças à tecnologia uma boa empresa de auditagem técnica poderá utilizar aparelhos especiais para avaliação de desempenho. Onde antigamente dependia-se exclusivamente dos sentimentos e alguns cálculos, hoje conta-se com aparelhos feitos sob medida para uma série de ensaios. Os microcomputadores, por sua vez, permitem controles e cálculos excepcionais. Aliás, o que antes chamávamos de microcomputadores são atualmente excelentes ferramentas de cálculo e registro de informações.
O crescimento da oferta de cursos é outro aspecto importante na capacidade de avaliações técnicas. No Brasil hoje temos muitas escolas técnicas e faculdades com bons professores e laboratórios. Nelas todo ano formam-se profissionais em condições de serviços elaborados, dentro do estado da arte. Tudo isso significa a possibilidade de maior segurança e o direito e obrigação de maior atenção com as cidades. Elas poderão oferecer espetáculos tenebrosos como o do edifício Joelma, que em São Paulo matou mais de duas centenas de pessoas num incêndio pavoroso. Evitar acidentes é possível e muito mais barato e triste que corrigir acidentes.

JCC, 19.12.2000

Arranha céus

Os prédios altos eram chamados de arranha céus. Eram o orgulho das cidades. Quanto mais alto fosse o principal edifício da cidade, mais o seu povo se envaidecia, mostrando a todos que a cidade crescia e aparecia. No Brasil o Edifício Martinelli fez época assim como o Empire States é um emblema do poderio norte americano, mesmo agora quando há tempos perdeu a primazia de ser o maior do mundo.
E continuamos a ver espigões nascendo pelas nossas cidades. A violência urbana expulsa moradores de suas casas. Na esperança de viver com mais proteção procura-se apartamentos cercados por todo tipo de cerca e alarmes. Esses arquivos de gente ganham sofisticação e se transformam em pesadelos urbanísticos.
Nossas cidades sofrem o impacto da motorização. Carros mais baratos, gasolina nem tanto, e todos procuram se deslocar com seus próprios veículos. As ruas não são elásticas. Atender as necessidades de qualquer família exige escolas, supermercados, farmácias e clubes, igrejas e serviços de energia, água e esgoto, uma coleção de serviços que precisam de espaços e custam uma dose de poluição. A concentração humana, a valorização dos terrenos, a luta pela sobrevivência faz com que as cidades se transformem em autênticos formigueiros, longe dos ambientes bucólicos das pequenas vilas.
Construir cidades inteligentes é nosso desafio. Nesse contexto precisamos equacionar uma série de requisitos como alinhados acima. Prédios altos? Tudo bem. E como evitar que se transformem em outros pesadelos? Metrô? Temos dinheiro para sustentar a infraestrutura necessária? O povo está disposto a pagar mais impostos?
O planejamento e a disciplina sob programas é essencial ao desenvolvimento sadio. Infelizmente nota-se que todos querem que os outros respeitem as leis, normas e técnicas. É muito difícil encontrar alguém que aceite tranqüilamente limitações a seus interesses. De uma forma ou de outra procura-se burlar técnicas e formas de gerência urbana.
Os temas mais em voga são ecologia e meio ambiente. É bonito e charmoso falar em respeito à natureza, ao mico leão dourado e pinheiro. O lamentável é ver tanta gente falando de coisas distantes e esquecendo a própria casa. Qualquer decisão, que exija novas construções e hábitos poluidores, dentro de uma cidade, é algo que precisa de atenção às exigências de um desenvolvimento inteligente. Vamos para mais eleições. É fundamental que a população escolha bons candidatos, bons vereadores e prefeitos e que tenha a honestidade de cobrar de seus preferidos o atendimento às necessidades da cidade. O clientelismo, eleger pessoas para contornar leis e resolver problemas pessoais é um péssimo e caríssimo hábito de muita gente sem qualquer sentimento social.
Acreditamos, contudo, na evolução. Novas gerações, novos processos mentais poderão abrir a cabeça de nossa gente. A inteligência é estimulada intensamente pelos novos sistemas de comunicação. As crianças modernas vivem em frente a teclados aprendendo que precisam dominar certas regras para terem sucesso. As cidades são o resultado coletivo de milhares a milhões de inteligências. À medida que se desenvolverem talvez percebam a necessidade de aplicação às questões urbanas. Todos somos responsáveis pela vida coletiva, solidária, queiram ou não os cidadãos. A sobrevivência com maior qualidade de vida depende da compreensão dos fatores de desenvolvimento urbano. Os “arranha céus” precisam cutucar nossa visão da vida nas grandes cidades.

JCC, 16/8/2000

Água, esgoto e lixo

O Instituto de Engenharia do Paraná estará promovendo, com o apoio de diversas entidades, um seminário sobre as técnicas de coleta e tratamento de água, esgoto e lixo. Esse seminário acontecerá entre 18 e 20 de outubro próximos. A principal intenção será discutir técnicas de menor custo que poderão ser utilizadas nesses tempos futuros, tempos de século 21.
A Engenharia felizmente já possui muitas soluções inteligentes. Não fosse isso e muitos países superpopulosos estariam noutra situação. Vale a pena comparar o Paraná, um estado com tantos rios e espaços, com outros países:
Paraná – 200 mil quilômetros quadrados – 10 milhões de habitantes
Paquistão – 800 mil quilômetros quadrados – 130 milhões de habitantes
Bélgica – 31 mil quilômetros quadrados – 10 milhões de habitantes
Bangladesh – 144 mil quilômetros quadrados – 116 milhões de habitantes
Podemos sentir por esses poucos exemplos que ainda falta muito para a saturação de nossos recursos naturais. As manchetes sensacionalistas de que a água doce estaria acabando e coisas do gênero são boas para impressionar e fazer clima neurótico. Não correspondem à verdade.
A questão principal será viver bem, com boa qualidade de vida. O ideal será a preservação do que for melhor de modo a se garantir bons padrões de vida aos futuros habitantes de nosso planeta. O uso inteligente, racional e criterioso da água é uma forma de respeito à Natureza e suas complexas equações.
Sabemos que o principal fator de agressão ao meio ambiente é a agricultura e pecuária extensivas, o uso de agrotóxicos e as próprias cidades quando mal planejadas e gerenciadas. Nas cidades as técnicas para obtenção de água doce e o tratamento de seus efluentes são fatores de saúde pública.
Existem tecnologias caríssimas assim como soluções de menor custo. Cada uma com seus aspectos positivos e negativos. Dentro das casas usamos equipamentos que poderão desperdiçar ou minimizar perdas. Lamentavelmente não temos no Brasil nenhum órgão atuando com rigor contra os maus produtos, aqui vende-se qualquer porcaria, o consumidor é o eterno otário. Pagamos caro pela falta de atenção às tecnologias utilizadas.
Conselhos, institutos, sindicatos precisam ser mobilizados para vigilância contra as piores soluções e equipamentos. Os bons profissionais conhecem, sabem o que é bom ou ruim. O cidadão comum precisa também saber onde pisa. O desperdício é um crime ambiental e precisa ser visto como tal. O grande desafio é gerar e aplicar leis inteligentes nesse sentido.
O desafio do seminário de outubro no Instituto de Engenharia será criar um ambiente em que seus debatedores e público saiam mais conscientes da necessidade de se desenvolver e aplicar formas de utilização e tratamento dos sistemas de coleta e tratamento de água, esgoto e lixo de forma racional, ampla e segura. A utilização de sistemas de baixo custo é um imperativo de nossa eterna penúria de recursos. Qualquer aglomeração humana, contudo, deverá aprender a usar alguma técnica de modo a ter mais saúde e menos efeito de agressão ao meio ambiente. Muitas soluções prescindem a intervenção das grandes concessionárias. Existem equipamentos e produtos para tratamento de água, esgoto e lixo em pequena escala, aproveitando-se até sub produtos na lavoura e produção de energia. O que falta é um processo inteligente de conscientização e orientação da população. Queremos dar um passo nesse sentido em outubro.

JCC, 11/08/2000

Planejamento urbano

A construção de uma cidade é coisa séria. Bairros, ruas, prédios, tudo afetará a harmonia de quem já viver em seus limites. A responsabilidade é muito grande, todos os seus cidadãos afetam a qualidade de seu crescimento, pesando nos padrões que terá ao longo dos anos.
Há detalhes que precisam ser entendidos. Um prédio é uma rua vertical. Muitas vezes decide-se construir um edifício com muitos apartamentos, escritórios, lojas e tudo o mais. Ele pronto será um foco de convergência de trânsito, de pessoas e atividades muitas vezes incompatíveis com a estrutura urbana existente. E o “progresso” poderá ser cruel ao instalar fábricas em áreas de preservação ambiental, ocupando áreas que deveriam apenas conter florestas e estimulando a ocupação de outras áreas, que deveriam permanecer em seu estado natural.
Os problemas de água e esgoto e a própria convivência com a Natureza poderão vir de decisões aparentemente brilhantes. Quem conheceu a cidade de Belo Horizonte há quarenta anos sabe como ela perdeu qualidade com a industrialização agressiva. Tornou-se pólo de imigração, cidade sem controle e local de inúmeras favelas. Essa também foi a história de outras monstrópolis. Hoje o Brasil apresenta uma coleção de cidades onde a violência, a miséria e a extrema riqueza convivem num quadro macabro.
O Brasil precisa de uma política urbana. Lamentavelmente os últimos governos acabaram com a EBTU e outros órgãos de planejamento e apoio. Nos estados alguma coisa se sustenta. Falta, contudo, um pólo de discussão e orientação às cidades brasileiras. Aliás, nossas cidades estão órfãs. Muitas inclusive nem deveriam existir, foram criadas para a formação de cartórios e definição de currais eleitorais. Vivem à míngua, pedindo esmolas nos gabinetes estaduais e federal.
As eleições municipais assustam. Milhares de candidatos a prefeito e muito mais a vereador pretendem assumir o comando dos municípios brasileiros. A imensa maioria deles não tem formação alguma em legislação e administração de cidades. Vão na ânsia de carreiras de poder, de luzes e sobre um clientelismo da pior espécie.
Precisamos de mais cuidado na construção das cidades. Elas são extremamente sensíveis às lógicas de seus líderes. Nessa altura dos tempos já sabemos que é preciso muito cuidado, que a preservação da Natureza é uma condição de inteligência. Sabemos que a preservação dos rios é fundamental à saúde de todos. Qualquer pessoa razoavelmente instruída poderá alinhar uma série de cuidados. O problema é que a maioria esquece esses limites quando eles atingem seus próprios interesses pessoais. As leis valem para os outros.
Em Curitiba estamos no início de uma campanha eleitoral importantíssima. Nova Lei de Zoneamento, novas fábricas e favelas são o desafio de nossos futuros gerentes. O que eles pensam a respeito? Como reverterão o processo de degradação que a cidade está passando? Como compensar os erros de Brasília?
A real solução para as cidades brasileiras seria a existência de programas que estimulassem a descentralização econômica. A reforma agrária será uma delas se vier a ser feita com qualidade e sem a geração de conflitos maiores. O apoio às pequenas cidades, às empresas brasileiras instaladas em seu interior, o estímulo a atividades agrícolas, que exijam mão de obra em abundância, isso e muito mais precisa ser feito para que o Brasil, suas cidades e Curitiba tenham um crescimento sadio. Sentimos demais a falta de planejamento nacional.

JCC, 13/8/2000

Seminário IEP

O Seminário "Água - Problemas e soluções para o século 21" mostrou com muitos detalhes a situação dramática de nosso povo sob o ponto de vista de saneamento básico. Confirmando informações de outros encontros técnicos dessa natureza, ampliou a visão da gravidade dos problemas que afetam a vida da nação brasileira. Detalhes como o de que mais de 90% do esgoto coletado no Brasil é lançado diretamente nos rios, 65% dos leitos hospitalares são ocupados por pessoas com doenças de origem hídrica, os investimentos na área de saneamento básico estão muito abaixo do necessário, falta educação e disciplina ambiental, o planejamento urbano perde-se pela indisciplina e desespero social, a ausência de um programa habitacional para o povo mais humilde traz prejuízos e riscos a todos, não existe vigilância adequada sobre nossos recursos hídricos e muitas outras informações ressurgiram durante o seminário.
Lamentavelmente acostumamo-nos a viver sob falsa qualidade. As questões técnicas envolvendo água, esgoto e lixo não são percebidas diretamente. Por exemplo, qualquer falha no abastecimento de energia elétrica é imediatamente sentida por todos, alterações nos serviços de transporte coletivo poderão levar até a levantes populares, em muitos serviços públicos é fácil saber quando existe uma falha grave. Na área de saneamento básico, contudo, os piores problemas não são visíveis com facilidade. Os grandes focos de doenças estão longe dos olhos de grande parte da população. A mais atingida é a miserável, a sem terra, sem casa e sem acesso à mídia. No entanto, os problemas afetam a todos, em maior ou menor escala, com violência proporcional aos piores casos.
Na capital paranaense temos um exemplo típico do que acontece em nosso país. Pouco a pouco as áreas de mananciais estão sendo invadidas e as nascentes dos rios que abastecem Curitiba estão em processo de degradação. Na visão de muitos militantes "verdes" floresta ciliar é coisa de reservatório, de barragem, talvez porque seja mais fácil bater nas empresas de energia. A omissão é grave. O assoreamento brutal e a poluição mostram que elas de fato são mais importantes ao longo dos rios, onde vemos ocupações de toda espécie.
Nas margens de nossos rios já vemos casas de todo tipo, principalmente casebres onde as privadas são buracos dirigidos diretamente às margens.
As cidades crescem, o produto da coleta do sistema de coleta de esgoto vai, em quantidade significativa, diretamente para os rios. Em muitos lugares, dentro de bairros elegantes, prédios inteiros simplesmente lançam seus produtos na rede de águas pluviais. A qualidade das águas servidas precisa de mais produtos químicos para não matar. Os rios que atravessam nossas metrópoles transformam-se em metrôs de merda (com o perdão da palavra), lixo e produtos químicos de toda espécie.
O Brasil mergulhou na neurose monetarista, política e lógica de muitos alienados sociais. Na preocupação de resolver a inflação e "modernizar" (ou melhor: entregar o Brasil) abandonamos projetos e diretrizes vitais. A questão "saneamento básico", à semelhança da segurança, emprego e outros apontados pelos dedos de FHC em campanha, está abandonada. Felizmente o sistema democrático exige eleições. A ascensão dos partidos de esquerda nas últimas eleições talvez acorde os criminosos que governam nosso país. Eles ainda têm tempo para restringir despesas com juros absurdos e produtos supérfluos e juntarem divisas para o combate à miséria em nosso país. Talvez seja exigir demais de tecnocratas e políticos, que se acostumaram a discursos ideológicos e fáceis, apoiados na mídia internacional.
Temos novos prefeitos eleitos. Eles assumirão em janeiro, outros foram reeleitos. Junto a eles milhares de vereadores. Muitos são novos, outros já experientes. Nossa esperança é de que acordem para a nossa realidade. O povo brasileiro precisa de soluções urgentes para seus maiores problemas, entre eles o de saneamento básico. Para solução de nossos problemas nessa área basta a utilização de nossa mão de obra, tijolos, metais e técnicas brasileiras. Para não atrapalhar essa lógica precisaremos, entretanto, de uma nova visão política e econômica. As principais: as inflações de doenças e indignidades são nosso maior e mais grave problema, devendo ser combatidas a qualquer custo.


JCC, 27/10/2000


Dois mil quilômetros de calçadas

O prefeito Cássio Tanigushi, reeleito, tem agora o compromisso de construir dois mil quilômetros de calçadas. Será uma obra memorável se feita de forma adequada. A exemplo de muitas calçadas já feitas em Curitiba, onde o asfalto é o piso, ao contrário das famigeradas pedrinhas (imitação de Copacabana) denominadas "mosaico português", esperamos que esses dois mil quilômetros sejam transitáveis, seguros, anti derrapantes e contínuos. A Rua das Flores foi um péssimo exemplo. Talvez muito bonita se vista de avião, continuou sendo um lugar ruim para caminhar graças à irregularidade do piso. O que deveria ser uma faixa para os deficientes visuais, uma trilha ridícula no meio da rua, é uma demonstração de como seria melhor se o piso daquela via pública fosse feito de material adequado.
As calçadas, sendo bem feitas e mantidas, são fator de conforto, segurança e oportunidade de trânsito para pessoas que hoje ficam presas em casa por falta de condições de segurança na cidade. Vimos investimentos em muita segurança eletrônica. As estações tubo possuem elevadores. Em muitos cruzamentos rampas existem para garantir a passagem de pessoas em cadeiras de rodas. Tudo para não levar a lugar nenhum em grande parte da cidade. Falta o principal, o passeio bem feito, contínuo.
Os atropelamentos serão menores se as calçadas existirem de forma adequada. A segurança do nosso povo aumentou com os radares, as lombadas, as multas maiores. A cidade precisa, contudo, ser ajustada ao pedestre, ao cidadão que anda.
Caminhar é saudável. É tão importante que vemos em muitos parques as pessoas gastarem energias, que economizaram transitando de automóvel. É até divertido lembrar que muita gente faz questão de usar automóvel para qualquer deslocamento. Ao final do dia, entretanto, vestem uniformes de atleta e saem correndo em volta de quarteirões com os cachorros em seus calcanhares. Caminhar é saudável e a simples opção pelo ônibus, pelo deslocamento sem veículo próprio já seria uma grande forma de exercício físico. O problema chama-se acima de tudo segurança. O pedestre nas grandes cidades brasileiras é caça de bandido e alvo de motoristas. Ou é assaltado ou atropelado. Nessas condições vemos as ruas entupidas de carros de toda espécie pois quem pode procura se defender fugindo das agressões urbanas.
A violência social é uma realidade brutal, precisa ser resolvida. Em paralelo as cidades devem mostrar mais respeito por aqueles que optaram pelo transporte coletivo, pelas caminhadas. O Plano Dois Mil é uma esperança de termos uma Curitiba mais inteligente e justa. Esperamos que nosso Prefeito cumpra essa promessa de campanha com o máximo de dedicação e competência.

JCC, 6/11/2000

Planejamento urbano e responsabilidades

O Poder Legislativo desenvolve leis. O mais democrático dos poderes transforma em obrigações o que a vontade popular e de seus patrocinadores acredita ser justo e necessário. No Brasil, país que ainda dá ao Poder Executivo a capacidade de legislar, a montanha de leis cresce diariamente. Chegamos a detalhes absurdos, viabilizando toda espécie de controle, vigilância e achaques. É o jogo do poder que nem sempre oferece bons resultados mas é produto direto da inteligência humana. Enquanto muitos animais mostram os dentes, urinam para marcar território e cantam e uivam, tudo dependendo dos equipamentos que a Natureza lhes deu, entre nós vale o papel, a negociação transformada em leis, normas, regulamentos etc.
O ano 2000 entra para a história do Brasil com a Lei de Responsabilidade Fiscal. É divertido ver o que essa lei determina e assusta tanto prefeito. Ela simplesmente diz o óbvio contábil e ético. O principal, fica proibido gastar além das possibilidades de pagamento. Talvez nosso povo ainda não tenha percebido que esse documento vem em defesa do contribuinte, do pagador de impostos. Sobre ele sempre cai o peso das despesas públicas, sejam elas sociais, estruturais ou institucionais. O brasileiro, talvez por efeito de tantos anos de censura, esqueceu-se de que as contas públicas são pagas em cima dos impostos. Agora vê até perplexo a mobilização de lideranças contra os efeitos dessa lei óbvia mas absolutamente necessária. Mais interessante é ouvir a explicação do presidente da Câmara de Deputados, ou seja, a lei não tem efeito retroativo, o que também é justo e lógico. Assim ficamos imaginando que esses prefeitos foram a Brasília passear ou pedir o absurdo, ou seja, mudanças num documento simples e justo.
Com imensa satisfação nota-se agora a preocupação com o planejamento. Os partidos precisam ensinar a seus executivos o que significa o novo quadro legal. E muitas outras leis aconteceram nesses últimos anos. Na área de meio ambiente há muito a estudar. O Ministério Público, se devidamente acionado, fará uma festa. Vai faltar advogado.
A Lei de Responsabilidade Fiscal valoriza o planejamento, a definição cautelosa de projetos. Durante a campanha vale tudo. Todos terão de graça todos os serviços. Agora a realidade.
E o noticiário policial é o espelho cruel da crise social. Abandonamos crianças, ganhamos bandidos. Não nos preocupamos com a educação profissional, enchemos as ruas com catadores de papel. Acabamos com o BNH, ganhamos favelas. Destruímos florestas, estimulamos o transporte individual, asfaltamos tudo, recebemos poluição. Não alimentamos o povo, temos doenças de toda espécie.
Planejamento, responsabilidades, precisamos acima de tudo de vergonha e vontade firme de corrigir os rumos do Brasil.

JCC, 13/11/2000

Arquitetura e urbanismo racionais

Crise energética, poluição, custos e benefícios, que serão pesados no século 21, precisam entrar de sola nos cursos de Engenharia, Arquitetura e Urbanismo. Não poderemos desperdiçar recursos naturais mesmo que eventualmente o empreendedor tiver dinheiro para tanto. O crescimento da população humana e o agravamento das questões ambientais exigem o banimento de técnicas de baixo rendimento e poluidoras.
Vale a pena perguntar, os cursos de nível superior estão sendo adaptados a essa nova realidade? Que universidades estarão formando profissionais em condições de usar os recursos naturais de forma otimizada? Será que esse assunto já saiu das escolas de primeiro e segundo grau?
A estiagem que estamos passando avivou a crise energética. A falta de dólares chama a atenção para a necessidade até econômica de se economizar petróleo. A resistência a novas hidroelétricas e o kWh caro das termoelétricas, que logo pesará nas tarifas das empresas de energia elétrica, são argumentos de um conjunto que simplesmente dizem que precisamos ajustar nossos cursos para a necessidade de maior racionalidade nos novos projetos.
Além das universidades a indústria deverá modificar seus produtos para diminuição da poluição e melhor aproveitamento dos recursos naturais. Um bom exemplo são as famosas válvulas Hydra, sabemos que não funcionando direito levam a desperdício de água. Casas e prédios precisarão rever seus circuitos para aproveitamento das águas das chuvas, assim fazendo poderão diminuir a carga sobre as concessionárias e contribuir para a retenção de águas durante grandes tempestades. Precisamos evitar a péssima qualidade de outras grandes cidades brasileiras, o custo das correções é gigantesco.
É bom insistir na tese, os cursos de Engenharia, Arquitetura e Urbanismo precisam ensinar a seus alunos como projetar de modo a se reduzir o consumo de energia e água, como aproveitar melhor as águas usadas, o que fazer com o esgoto e a importância dos tratamentos preliminares.
Nossos legisladores precisarão debruçar-se sobre o assunto. Isso coloca uma grande responsabilidade entre os eleitores pois deverão escolher seus vereadores e prefeito entre pessoas preparadas para entender e administrar as questões técnicas que aparecem e não simplesmente atender os desejos prosaicos, que vemos serem colocados em qualquer contato político (aqueles ditos em voz baixa e mais importantes para os líderes de bairro do que as questões realmente significativas para a cidade).
Curitiba está em fase de ajustes de suas nova Lei de Zoneamento Urbano, na esteira desse processo deveria desenvolver uma legislação mais dirigida para a otimização dos espaços e recursos urbanos. Um bom exemplo disso é a lei que dispõe sobre as garagens, permitindo e até incentivando a construção de garagens acima do nível do solo. Nessa condição os prédios gastarão menos energia, poderão impactar menos o ambiente durante as grandes chuvas além de terem redução de custos de construção (Lei de autoria do vereador Borges dos Reis por sugestão do Instituto de Engenharia do Paraná).
É urgente criar um novo padrão de profissional, aquele capaz de entender e praticar técnicas conservacionistas. Nossos gerentes universitários estão preocupados com essas questões?

JCC, 4/6/2000

A arquitetura, urbanismo e o século 21

Nossos cursos de arquitetura precisam mudar. Por uma série de circunstâncias e talvez em reação aos cursos de engenharia têm sido ambientes de supervalorização da estética, da beleza de prédios e cidades. Em muitos casos sustentam propostas belíssimas se vistas de aviões, à distância. A preocupação pela estética é humana, é natural, feminina e gera resultados divinos. Procuram seus profissionais o toque sublime que os tornará notáveis, reconhecidos, respeitados. Estamos, contudo, chegando ao século 21. Como conciliar espaços e concretos com a economia de energia? Com o aproveitamento ótimo de materiais? Com a formação de ambientes saudáveis e ajustados a uma natureza que desaparece sob o asfalto?
Em inúmeros seminários temos visto discursos apaixonados a favor da natureza, alguns chegam a propor o reflorestamento radical, só faltam pedir a todos, como nos disse o Bussunda em um antigo número da revista Casseta e Planeta: “é proibido respirar pois transforma-se oxigênio em CO2”. O radicalismo acaba desmoralizando conceitos conservacionaistas. Desses extremos ao que é possível passamos pela educação técnica e um ambiente estratégico está em nossas universidades, mais precisamente, nos cursos de arquitetura e urbanismo.
Em Curitiba não é raro notarmos que residências e prédios públicos são construídos como se estivessem em Recife ou no Rio de Janeiro. No inverno morre-se de frio dentro deles e qualquer tentativa de aquecê-los custa uma fábula de energia. Áreas imensas são impermeabilizadas. Nem o poder público tem a capacidade de exigir nessas imensas construções o aproveitamento de águas pluviais. Nos edifícios as garagens precisam ser subterrâneas pois acima do solo seria “feias”. Assim gasta-se muita energia para mantê-las secas e a água acaba sendo lançada na rede coletora exatamente quando a chuva é mais forte, agravando o problema das inundações nas áreas mais baixas. Pior ainda é quando inventam um distrito industrial em área de preservação ambiental.
O século 21 precisa ser o da conscientização e redirecionamento do desenvolvimento de nossas cidades. Isso só acontecerá efetivamente se todos os processos educacionais tiverem este enfoque. Da Engenharia às prendas domésticas todas as carreiras profissionais deverão ensinar a seus alunos como minimizar a poluição e o consumo dos recursos naturais.
A celeuma da proposta de ocupação econômica da Amazônia foi um exemplo emocional do sentimento de nossa população. O interessante é que enquanto reagem contra os madeireiros pouco fazem para mudar seus próprios hábitos consumistas e profissionais. O desperdício é a marca de muitas sociedades, noutras a simples indiferença em relação à natureza. Muitos dos desertos existentes tiveram a prestimosa contribuição de povos operosos e ignorantes. Aliás, deveríamos propor o reflorestamento dos continentes mais velhos. Neles a devastação foi quase total.
Somos brasileiros, vivemos num belo país, para que não perca muito de seu encanto e não venha a ser ambiente envenenado e caro precisaremos de nossos profissionais de arquitetura e urbanismo com nova postura profissional. Para que mudem de modo que a Natureza se conserve será fundamental a alteração dos cursos que lançam anualmente milhares de novos profissionais no mercado. Gente nova, cabeças novas e o desafio de fazermos do século 21 o século da racionalidade.

JCC, 19/5/2000


Reconstrução civil

As grandes cidades vão se desenvolvendo criando novas áreas e perdendo outras. Bairros elegantes descem na escala social, centros comerciais viram lugares de atividades ainda comerciais mas com objetos muito diferentes dos iniciais. As drogas e a prostituição mais fuleira costumam acompanhar esses locais tornando-os impróprios a menores e freqüentemente perigosos a qualquer cidadão. É o preço da liberdade. Em sociedades totalitárias, ditatoriais, o grande chefe poderá desenvolver estratégias de engaiolamento que gerarão imagens melhores mas cobrindo situações nem sempre publicáveis, tudo isso ao custo da liberdade. Vale a pena?
A indústria do turismo tem um potencial enorme mas nosso país distante dos grandes pólos econômicos encontra dificuldades na competição com paraísos mais próximos dos povos ricos. O turismo no Brasil depende muito da capacidade de nossos vizinhos, principalmente dos argentinos, mais ricos e numerosos em nossas praias. A grande virtude do turismo é gerar empregos para todo tipo de profissional. Desde o trabalhador mais humilde até os grandes executivos encontram seus espaços no atendimento a gente que procura em lugares distantes uma forma de se divertir e relaxar da rotina de suas atividades.
Outras atividades aparecem com possibilidades imensas de crescimento, em especial os serviços gerados pela informatização de serviços. Graças aos computadores uma gama infinita de atividades torna-se possível precisando apenas de bons profissionais nessa área. Nosso povo mal sabe escrever...
Ecologia, meio ambiente, desenvolvimento, tudo somado exige o não desperdício. O aproveitamento otimizado de espaços já ocupados é fundamental à redução da expansão física da presença humana sobre a Terra. Aumento de produtividade é a chave tanto contra a agricultura extensiva quanto a expansão das manchas urbanas.
Outro aspecto importante é o custo das grandes distâncias. O transporte coletivo e individual crescem de preço à medida que as pessoas se obrigam a morar longe de seus pólos de atividade normais. É lamentável ver famílias deixando de viver junto a seus locais de trabalho, fugindo para bairros distantes. Pior ainda é perceber que nossos trabalhadores mais humildes instalam suas famílias em municípios distantes. Tudo isso mostra a importância da sustentação dos centros tradicionais e, se possível, o aprimoramento desses locais de modo que retenham aqueles que nele trabalham.
Assim a reconstrução urbana é um fator importante no planejamento urbano. Como ativá-la? O que fazer para que os pólos urbanos sejam equilibrados e tenham capacidade de sustentação de suas populações?
Legisladores e executivos municipais precisam debruçar-se sobre tudo aquilo que afeta o desenvolvimento urbano. A reconstrução civil é essencial ao sucesso das estratégias conservacionistas. O aproveitamento com inteligência de áreas antigas poderá estimular o não transporte (de custo muito menor que o transporte), valorizar áreas de grande valor afetivo e histórico e acima de tudo criar novos empregos e atividades de que tanto precisamos.

JCC, 20/5/2000

Orelhões e barreiras arquitetônicas

Curitiba é uma cidade cujos planejadores costumam valorizar tanto a estética que até as necessidades dos idosos e portadores de deficiências são consideradas secundárias. A luta para os ajustes a favor dos portadores de deficiências encontra a má vontade de nossos gerentes e assim a reforma do calçadão da Rua das Flores manteve padrões condenáveis e até contrariando lei sancionada pelo prefeito atual.
Surpreendentemente os orelhões mudaram de padrão e o fizeram colocando um monstrengo nas ruas curitibanas. Vá ter mau gosto lá na casa da...
Além da falta de cuidado estético os novos telefones públicos e seus protetores não foram feitos para considerar o trânsito dos deficientes visuais. Conversando com uma senhora cujo marido é quase cego ela me disse que não é raro ele machucar-se batendo com a cabeça na concha de cobertura do telefone. Na base não se colocou nada para alertar da presença do telefone e assim, ao caminhar, se a bengala não tocar no cano de suporte (estreito) ele não consegue perceber em tempo a existência do orelhão.
As reformas da Rua Pedro Ivo assim como o foi a da Rua André de Barros felizmente foram feitas com blocos que formam um piso antiderrapante como pretendia lei aprovada nesse sentido (lei de autoria do Vereador Antonio Borges dos Reis). Não tiveram o cuidado, contudo, de dar a esses tijolos cores diferentes de modo a tornar as calçadas mais bonitas. Será que o projetista dessas calçadas queria desmoralizá-las?
Na Pedro Ivo, apesar da falta de atenção estética, as calçadas foram alargadas. Sensacional, é uma rua com grande trânsito de pedestres, unindo pólos importantes dos usuários do transporte coletivo urbano. Vamos torcer para que os ambulantes e a própria PMC não instalem obstáculos penalizando quem precisa caminhar por essa rua.
Diversas reportagens e a simples observação de nossas cidades mostram que a população brasileira está com um número crescente de idosos. Gente que aos poucos adquire restrições motoras e sensoriais. Esses brasileiros que construíram esse país merecem respeito e a eles não se poderá negar o direito de ir e vir.
Como nossos arquitetos e urbanistas entendem esse processo? Será que eles sabem ajustar seus projetos a essa realidade?
O atual Ministro da Justiça notabilizou-se pela defesa da cidadania. O Ministério Público tem se apresentado de forma surpreendente diante de inúmeras injustiças e crimes. A legislação a favor dos portadores de deficiências já é extensa, falta apenas exigirem o cumprimento e aplicação delas em nossos institutos de planejamento e escritórios de arquitetura...
O orelhões curitibanos mostraram ausência de atenção estética e de atenção pelos portadores de deficiências. Em Curitiba a falta de cuidado pela qualidade visual dos equipamentos urbanos é novidade. A operadora desses telefones, por sua vez, perdeu uma excelente oportunidade de mostrar mais respeito pela cidade. Nunca é tarde para se corrigir uma besteira.

JCC, 21/5/2000

As melhores cidades e Curitiba

A revista Exame apresentou reportagens e pesquisas mostrando Curitiba como a melhor de cem cidades brasileiras para negócios. Sabemos disso há muito tempo mas agora a cidade ganha ares de metrópole em expansão inequívoca, não podendo mais esconder-se do resto do Brasil.
A capital paranaense possui condições estratégicas excepcionais. Junto a diversos portos com capacidade de expansão considerável, topografia ondulada, rios sem o pesadelo das grandes enchentes, clima ameno e povo trabalhador e capaz, Curitiba reúne tudo isso podendo desenvolver-se quando cidades gigantescas como São Paulo e Rio de Janeiro chegaram ao nível de monstrópolis.
As cidades dinossáuricas são aberrações perigosas. Qual o tamanho ideal? Como disciplinar o crescimento?
O sul do Brasil tem belas e boas cidades. Felizmente nossas famílias souberam evitar excesso de filhos, tiveram o cuidado de educar seus filhos, gerar empregos, criar empresas. E agora? Como evitar a migração acima da capacidade de absorção? Sem invasões de áreas de mananciais, de fundos de vale, sem a formação das famosas e terríveis favelas?
Está na hora de se criar uma nova estrutura administrativa em nosso país. O conceito de região metropolitana precisa urgentemente ser ampliado permitindo a formação de gerências metropolitanas mais fortes, capazes de impor a suas cidades maior disciplina. Pouco adianta uma cidade criar instrumentos de controle se ao lado o prefeito permitir qualquer loucura. Em Curitiba isso é mais do que visível. E mais coisas aparecem nas cidades conurbadas. O peso da administração técnica de uma cidade menor junto a uma grande cidade fica acima de suas capacidades. O resultado é a falta de atenção para uma série de questões que se refletirão sobre a cidade pólo.
Em Curitiba vemos a questão dos mananciais. Felizmente a lei do imposto ecológico ( deputado Neivo Beraldin) cria incentivo à preservação dessas áreas. Seria suficiente? Sabemos que não e o que realmente está fazendo falta é a existência de uma COMEC mais forte, capaz de impor disciplina em todas as cidades de sua área de influência, inclusive a capital paranaense.
O grande desafio do século vinte e um será crescer sem a repetição dos erros do século anterior. Não foram poucos. No Brasil agora vemos cidades antes maravilhosas já degradadas a níveis absurdos. Falta de critério e cuidados elementares fizeram com que qualquer chuva seja um pesadelo, o transporte coletivo um custo enorme, a água para beber muito cara e o lixo e o esgoto fatores de poluição tremendos. Num país com oito e meio milhões de quilômetros quadrados seus habitantes amontoam-se em poucas e péssimas cidades.
Curitiba tem instrumentos excelentes de planejamento urbano. IPPUC, URBS e COMEC são órgãos atuantes, com excelentes profissionais. Eles cumprem ordens. O que é imperioso é a eleição de políticos competentes e responsáveis. Não basta base técnica, será mais importante, já que não nos faltam bons profissionais, a eleição de prefeitos e vereadores realmente preocupados e dispostos a submeter Curitiba a um processo de desenvolvimento que a faça boa para negócios e para se viver.

JCC, 1/5/2000

Conselho Histórico e Geográfico de Curitiba

É irritante não saber quem deu o nome à rua que é nosso endereço. Que razões levaram nossos legisladores e prefeitos a escolher certos nomes a parques, praças e ruas?
Os historiadores carecem de recursos para registrar e publicar trabalhos a respeito de nossas cidades. As grandes batalhas de formação da grande nação ocupam os horários de aula e de trabalho dos grandes historiadores escritores. Precisam vender, trocar o tempo gasto por dinheiro que lhes sustentará. Assim fica difícil encontrar certas histórias e nomes exceto em nossos cemitérios e placas de ruas.
A internet e o nível atingido pelos computadores pessoais permitem processos de divulgação a níveis de qualidade que não imaginávamos há pouco tempo. Os custos desses registros estão muito abaixo daqueles de antigamente para se atingir a mesma população. Não é difícil criar arquivos para consulta pública de qualquer assunto. É só querer e ter competência para tanto.
Diante de tudo vemos com entusiasmo o projeto de lei do Vereador Antonio Borges dos Reis propondo a criação do "Conselho Histórico e Geográfico de Curitiba" e a formação do "Dicionário Histórico e Geográfico de Curitiba". Isso significará a materialização de lutas já antigas como a de nossa amiga Anita Zippin, guerrilheira de nossa cultura paranaense.
A história de nossos heróis anônimos poderá vir a público. Precisamos conhecê-los, eles precisam deixar o anonimato e virem ao conhecimento de todos nós. O tempo é algoz inflexível. O esquecimento de nossos melhores cidadãos é fácil quando se vive em luta constante pela própria sobrevivência. A memória é extremamente importante para um povo que pretende ser respeitado.
Quantas vezes, viajando pelo mundo, não nos perguntaram o que era o Paraná, onde ficava e quais eram as características de Curitiba? Com a internet já não precisamos carregar enormes livros e folhetos, basta-nos indicar uma coleção de endereços onde já existe muita coisa. Vivendo no Brasil também poderemos com a aprovação e realização do projeto mencionado explicar a nossos conterrâneos detalhes da cidade em que vivemos.
O Dicionário e nosso Conselho também terão a oportunidade de construir um acervo que no futuro será de imenso valor a nossos descendentes. Com a preocupação de reunir detalhes sociais e técnicos, o Dicionário Histórico e Geográfico de Curitiba deverá reunir informações além da simples biografia do personagem que deu nome ao equipamento urbano registrado. Pouco a pouco poderá reunir informações outras que certamente serão de extremo valor para nossos futuros historiadores.
O Conselho Histórico e Geográfico de Curitiba, por sua vez, dedicando-se à capital paranaense, será o foro para discussão e análise permanente do processo de formação da cidade. Quantas cidades brasileiras têm algo equivalente? A sistematização é importante à existência de um processo contínuo. O que não é organizado tende a se perder, a não ter memória.
Graças a essa proposta do vereador Borges dos Reis, que esperamos não vir a ser obstruída por razões políticas, Curitiba terá mais uma ferramenta para a construção de seu sentimento de civilidade. A capital dos paranaenses merece mais esse recurso de fixação de sua própria cultura.

JCC, 1/5/2000

Velocidade

O crescimento das cidades e a generalização do uso dos automóveis trouxe-nos o pesadelo dos acidentes de trânsito. Aqueles que foram criados brincando nas ruas vêem assustados a ruas se transformarem em pistas de corrida e de tempos em tempos algum amigo morto em acidente de trânsito. O número de mortos e aleijados em nossas ruas e estradas atingiu um número tão elevado que uma legislação mais severa foi criada na esperança de diminuição da violência sobre rodas. A ignorância de boa parte de nosso povo arrisca neutralizar a disciplina pretendida. É incrível notar que até pessoas razoavelmente cultas e educadas revoltam-se contra a vigilância sobre os motoristas.
Não podemos recuar, é importante sustentar a atual legislação e apoiá-la com todos os recursos técnicos e humanos existentes de modo a que venha a ser nossa melhor realidade em pouco tempo.
Em Curitiba, em um momento infeliz de nossos planejadores, denominaram algumas avenidas estruturais de vias rápidas. O resultado foi se transformarem em pistas de corridas alucinadas, já tendo sido o circuito de inúmeros acidentes. Os radares vieram em defesa do povo. São instrumentos poderosos na vigilância do trânsito. Têm erros? Vamos corrigi-los mas torcemos para que se multipliquem e cheguem às ruas secundárias. Não é raro vermos nas ruas paralelas às grandes avenidas autênticas bestas humanas dirigindo seus veículos como se estivessem em algum autódromo.
Ganharemos velocidade com o metrô. Em via dedicada, isolada e protegida grandes composições transportarão milhares de pessoas através da cidade. É a única forma aceitável de velocidade dentro de uma cidade exceto, é lógico, para veículos de socorro e segurança. Falta-nos dinheiro para as tecnologias mais sofisticadas mas o metrô elevado poderá ser implantado a custos reduzidos, ainda que apenas em alguns trechos.
Não podemos, contudo, aceitar a fuga a uma legislação tão duramente conquistada. Na situação atual ficamos angustiados quando sabemos que algum filho está fora de casa. Nessa cidade de Curitiba onde encontramos anti pó (sem calçadas) até em ruas próximas ao centro e somos obrigados a caminhar sobre passeios feitos com muitas finalidades menos permitir um andar seguro, vemos com muita preocupação a velocidade dos automóveis. O que fazer? O IPPUC resiste em suas teses anti sociais e a população oriunda de fazendas mal sabe o que uma cidade poderia ser. A luta pela qualidade de vida torna-se estéril pois as elites não usam as calçadas da cidade, elas existem para enfeitar as suas ruas. Nos melhores shopping centers o ambiente tratado com esmero dá-lhes, essas elites, tudo o que desejam dentro de uma cidade.
O abuso no volante mostra com nitidez a qualidade da educação do motorista. Seu discurso esvazia-se quando sai pelas ruas feito um louco, esquecendo que nas calçadas existem crianças, pessoas idosas, gente que até por alguma deficiência mental, sensorial ou motora poderá não perceber seu veículo e vir a ser atropelado. A demência do motorista é tão grande que ele esquece que ele e sua família poderão ser as maiores vítimas de seus hábitos.
Radares, guardas, lombadas, leis enérgicas, precisamos de tudo isso para podermos viver com mais segurança nas cidades brasileiras. Chega de tanto acidente. Quem não tem algum familiar ou amigo morto em acidente de trânsito?

JCC, 1/5/2000

Metrôs

É bom ver nossas lideranças curitibanas defenderem a implantação do metrô. A capital paranaense não pode mais esperar, precisa iniciar o projeto de um sistema subterrâneo ou elevado para o transporte de sua população em seus limites territoriais. Entra-se em uma etapa de altíssimo custo. A cidade cresceu, problemas de trânsito foram criados por um planejamento idílico e agora a solução é mergulhar na terra ou sair voando por cima das casas.
É interessante, entretanto, notar que o transporte coletivo por ônibus poderia ser muito mais intenso. Graças à insegurança e ao desconforto do transporte coletivo urbano só usa ônibus quem não tem outra opção. A violência urbana cresce sem parar. Suas causas todos as conhecemos, as sociais e outras, as CPIs que o digam. Apesar de tudo o sistema poderia ser mais confortável e seguro. Nossos motoristas não dispõem de telefones em seus veículos, assim perdemos a vigilância de milhares de profissionais. Os ônibus com piso rebaixado, onipresentes nos países mais desenvolvidos, não existem em Curitiba. Nas canaletas a prioridade da sinalização ainda não é efetivamente dos ônibus. Muitos viadutos e trincheiras fazem falta. Ou seja, o sistema atual ainda oferece muitos espaços de otimização. Isso é importante, o projeto e implantação de um sistema metroviário é lento, até a entrada em operação a cidade deverá encontrar formas de melhor aproveitamento dos recursos existentes.
Sistemas elevados ou subterrâneos de transporte coletivo urbano são muito caros e impactantes. Já a primeira linha terá grande efeito sobre o comportamento do curitibano. Não se está propondo mais uma torre de biblioteca ou chafariz. A importância do metrô exige participação de todos, discussão aberta e franca de suas alternativas. Como fazê-lo?
A Prefeitura de Curitiba poderia desenvolver, instalar e utilizar um sistema de consulta popular “on line”. Nos terminais de ônibus, postos de saúde, escolas e rede internet convencional a população contribuiria com votos em pesquisas diárias e permanentes. O carnê do IPTU ou simplesmente os cartões magnéticos de bancos poderiam ser chaves de acesso à rede para as consultas sobre os grandes projetos e questões mais elementares. O sistema valeria também como ferramenta de simples e importantíssimas pesquisas de opinião. No caso do metrô haveria necessidade de inúmeras etapas de consulta além das pesquisas técnicas inevitáveis e essenciais ao projeto. Existem?
O endividamento excessivo é um perigo que a cidade de Curitiba precisa evitar firmemente. Felizmente a Lei de Responsabilidade Fiscal está em suas etapas finais. O povo brasileiro não pode continuar pagando contas de cidades e estados criminosamente irresponsáveis. Isso significa a necessidade de muito rigor na aceitação de novos programas de obras, de outros projetos. O metrô é um excelente exemplo. Seu preço não termina na inauguração. O custo operacional é elevado. É fundamental avaliar fluxo de caixa, analisar possíveis salários, preços de substituição de máquinas e ferramentas, garagens, oficinas, engenharia etc. Quem pagará a conta? Como?
Tivemos a onda de queixas contra o IPTU. O pedágio nas rodovias é um bom exemplo. O dinheiro para tudo sai do bolso dos contribuintes ou dos usuários do sistema. Todos esses cenários exigem análises técnicas e políticas importantes. No lançamento do primeiro projeto de metrô para Curitiba deveremos ver essa primeira rodada de discussões. Vamos torcer para que sejam honestas, não sectárias, com a profundidade técnica e social que exigem. O primeiro passo foi dado em 1999, nesse ano 2000, ano de eleições, com certeza o metrô será assunto de muitas discussões apaixonadas, ótimo!

JCC, 5/4/2000

Pedestres e atropelamentos

O número de atropelamentos continua crescendo em Curitiba. Reportagem da jornalista Leunice Klenk na Gazeta do Povo, dia 4 de fevereiro, mostra essa situação assim como registra afirmação de uma autoridade local de que a culpa é das vítima na maioria dos casos. Realmente, pessoas humildes, idosos, crianças, gente que não pode usar automóveis e fazer suas compras dentro de "shoppings centers" e que precisa usar as calçadas curitibanas, inclusive esporadicamente as mais ricas e saudáveis.
Criminosamente a cidade não respeita o pedestre. Proprietários de imóveis não se preocupam, de modo geral, com a qualidade dos passeios em frente a seus imóveis. Camelôs estendem seus mostruários nos lugares mais densos. Obras são feitas sem que se garanta espaços razoáveis para os caminhantes. E piorando tudo os nossos motoristas dirigem seus carros como se fossem donos das ruas. Mesmo dentro dos limites de velocidade permitidos no centro (e não são pequenos) dirigem contra qualquer um que atravesse à frente de seus veículos. Agem como vi um atropelador, provavelmente matador de um menino em frente da Rodoviária Velha, dizer que o sinal estava verde, por isso não prestou atenção à criança que resolveu atravessar a rua.
Questões técnicas deveriam ser ensinadas a nossos motoristas tais como a criança demora a desenvolver visão lateral, que as pessoas após uma certa idade perdem gradativamente capacidade de ver, ouvir e andar e que o próprio raciocínio pode ser afetado por inúmeras doenças. Seria importante dizer para nossos motoristas que a cidade de Curitiba tem faixas para pedestres mal feitas, falta sinalização adequada até no anel central, que o pavimento das calçadas é irregular e cheio de buracos. Não seria demais também alertar nossos motoristas para o fenômeno da imigração, da mudança para Curitiba de milhares de pessoas humildes vindas de vilas e pequenas cidades procurando uma oportunidade de trabalho. Seria extremamente importante dizer a esses pilotos de cidade que o mútuo respeito é fundamental à sobrevivência de todos e que a falta desses cuidados poderá aleijar ou matar seus filhos ou pais.
A legislação de trânsito tornou-se mais severa. Lamentavelmente a Justiça tem falhas que ainda não foram corrigidas. A agilidade dos processos é fundamental para que se tenha causalidade, para que todos sintam os custos e benefícios de viver sob o império das leis. Enquanto isso não acontecer aqueles indivíduos que matariam a própria mãe se a lei permitisse continuarão a correr e dirigir irresponsavelmente pelas cidades brasileiras.
É bom ver que nossas autoridades começam a se preocupar. A reportagem da Leunice mostra essa situação.
Vimos uma campanha educativa super agressiva conclamando os curitibanos a respeitar o trânsito e suas leis e parece-me, tendo por principal preocupação a liberação de ruas, evitar engarrafamentos e acidentes entre automóveis. Estranhamente faltou nos cartazes a indicação de que tipo de animal seria o motorista que não respeitasse faixa para pedestres, qual a espécie animal do piloto que dirige no centro da cidade como se estivesse em uma cidade sem pedestres e que espécie de bicho é o técnico e político que não se preocupam com a vida dos contribuintes e trabalhadores.
Curitiba vangloria-se de ser uma cidade do primeiro mundo, nós que moramos aqui queremos acreditar nessa fantasia andando com mais segurança pela cidade e vendo diminuir a cada ano o número de atropelamentos.
Nossos cumprimentos ao Lions pela "Campanha de Prioridade Absoluta de Preferência de Passagem do Pedestre no Trânsito".

JCC, 4/2/00

Violência urbana

Curitiba está se modernizando, aqui já temos áreas em que andar à noite significa assalto ou outras espécies de agressão. Onde? Nos bairros mais pobres, áreas de invasão, favelas, o império é dos bandidos. Péssimo início de século vinte e um espera esse povo. Será isso que se pretendia quando se fez tanta propaganda dos empregos que o Paraná estaria criando?
O que acontece nessas áreas é uma demonstração de que os estados e municípios não podem prescindir de receita tributária. O crescimento da população exige mais escolas, creches, habitações, segurança, ambulatórios e tudo o que qualquer aglomeração humana exige para uma vida decente. Infelizmente a compulsão eleitoreira de nossos políticos mais irresponsáveis leva-os a desenvolver propostas e projetos dissociados de nossa realidade social, a violência é um dos piores subprodutos dessa estratégia de “desenvolvimento”.
E as drogas? A CPI mostrou detalhes da extensão dessa praga. Onde os ricos vão comprar seus vícios? Onde os traficantes encontram soldados? Nesses ambientes mais pobres, lá é fácil envolver e cobrar serviços. Curitiba até que nesse ponto está mais tranqüila, afinal dizem os que conhecem esse problema que há pontos de distribuição de drogas espalhados pela cidade, bem sob o nariz até de quartéis.
A violência urbana também é o resultado do stress, das distâncias, da motorização e falta de estrutura da s cidades para tanta loucura. Crescemos depressa demais. O fenômeno da urbanização acelerada inchou cidades. Ruídos, poluição de toda espécie, tudo faz com que as pessoas se tornem mais agressivas. A capital paranaense, nesse aspecto, até que possui uma base cultural forte procurando protegê-la dos piores casos. Os radares, último recurso implantado, está diminuindo velocidades. A legislação nacional sobre trânsito deverá, quando a inspeção de veículos começar, a tirar de circulação os piores. Fábricas e ambientes comerciais passam pela vigilância de ONGs, jornais e Secretarias que diminuem um pouco o que poderia ser fator de degradação ambiental. Tudo isso não impediu, entretanto, a ocupação de áreas de preservação ambiental quando os imperadores da indústria automotiva simplesmente decidiram lá se instalar. Ainda pagaremos caro por esse “descuido”. Da receita fiscal, dos impostos que pagamos sairá a solução para esse crime.
A violência urbana, motivo de tantos heróis em filmes norte americanos, poderia ser muito menor. Ainda pode. Quanto custaria um programa de construção a custos subsidiados de casas populares? Casas decentes, bem feitas e cercadas de escolas, creches e tudo o que for necessário? Certamente não seria pouco mas seria dinheiro ganho de serviços sobrecarregados de policiamento, saúde e outros gerados pela desordem urbana. Quando nossos governos voltarão a ver as COHABS como instrumentos poderosíssimos de racionalização urbana e social?
Os jornais de Curitiba já falam em chacinas em seus bairros. Vendo filmes norte americanos ficamos até com inveja da competência e recursos dos sistemas de segurança dos EUA. A tecnologia e os policiais são superpreparados, impressão digital é coisa séria, análises de toda espécie são feitas de modo a se colocar os criminosos na cadeia. A tecnologia e a conscientização política são necessárias ao aprimoramento de nossas cidades.
Precisamos mobilizar lideranças sérias e competentes para uma grande discussão, preparação de propostas e cobrança sistemática de projetos que permitam um desenvolvimento sadio. Ainda há tempo para evitar a a transformação em uma monstrópolis.


JCC, 6/2/00

Festas explosivas

As comemorações brasileiras mostram quanto estamos distantes do respeito à vida humana. Talvez não sejamos os únicos mas o que vimos não corresponde à índole de um povo que acima de tudo era considerado pacífico. O resultado tem sido acidentes, pessoas lesionadas, algumas aleijadas e alguns mortos.
As grandes multidões assustam. As pequenas já causam preocupação, quanto mais a reunião de centenas de milhares de pessoas. Nos campos de futebol podemos ver essa patologia social. Em torno de clubes, bandeiras e camisas, gente que parecia racional passa a se comportar de forma alucinada, disposta a qualquer grosseria. As torcidas organizadas fazem inveja a Goebels. Nelas conseguem influenciar jovens a extremos mortais.
As festas, as competições esportivas, as grandes reuniões de indivíduos servem para marcar situações. Os fascistas foram mestres nessa pantomima. O resultado foi a Segunda Guerra Mundial.
O grande desafio do mundo superpovoado do século 21 será fazer juz aos conceitos padrões dos seres humanos. O principal é o de que somos animais racionais. Naturalmente, à medida que nos afastamos das florestas e nossos cérebros evoluem é de se supor que possamos resolver problemas maiores e mais complexos. Toda a tecnologia e conhecimentos adquiridos permitem-nos afirmar que a maioria absoluta dos acidentes são previsíveis, de que poderemos superar todas as barreiras, que surgirem dentro de um processo natural de desenvolvimento.
As grandes ciências humanas e exatas formam um conjunto de lógicas e arquivos, que estão à disposição da humanidade. O desafio é utilizá-los de forma adequada. Para tanto precisamos cuidar dos meios de comunicação e da defesa dos direitos fundamentais do ser humano. A questão ética será sempre avaliar os limites da liberdade do indivíduo e os direitos das sociedades. Até onde poderemos administrar a mídia? Até onde os jornais, televisões, rádios e outros sistemas de comunicação poderão dizer o que bem entendem? E a liberdade existe? Ela não seria simplesmente o direito dos poderosos de utilizar a riqueza e poderes para dominação dos menos ricos?
Vivemos em um planeta complexo. Essa é a maravilha de existir pensando. Pagamos um preço elevado quando essa inteligência também gera grandes armadilhas. Isso mostra a necessidade de fazermos com que nossas atividades sejam positivas, construtivas, saudáveis. Precisamos descobrir formas de não termos medo até das nossas festas. Não queremos terminar chorando eventos, que começamos com tanta alegria.

JCC, 5/1/2001

Cidades seguras

Está na hora de se pensar mais nos idosos. As estatísticas do IBGE mostram que o Brasil envelhece, que, em termos proporcionais, mais gente chega à terceira idade, que o povo brasileiro já apresenta um contingente razoável de pessoas idosas graças a melhores condições de assistência médica, melhor alimentação, à tecnologia, principalmente.
De fato nossos governos não costumam olhar muito pelos mais carentes. Pobres, portadores de deficiências e idosos não preocupam muito. Uns votam de cabresto, outros não votam, poucos realmente participam do processo político. Tudo isso leva nossa sociedade a ser mais violenta, hostil à presença das pessoas com algum tipo de restrição.
Curitiba é um bom exemplo. Muito é feito mas sem um plano abrangente e desprezando-se aspectos extremamente importantes para os idosos, PPDs, crianças etc. Não conhecemos, por exemplo, na administração municipal alguém dedicado a melhorar as calçadas curitibanas. Elas são extremamente importantes aos usuários do transporte coletivo, nem assim oferecem a qualidade e segurança desejadas, quanto mais para as pessoas com alguma restrição motora, sensorial ou mental.
O envelhecimento da população brasileira cria um novo mercado empresarial, ainda bem! Graças à essa condição, gerar riquezas, já se percebe programas turísticos dedicados à terceira idade. Nos balneários o idoso é o cliente de fora da estação, aquele que mantém estruturas.
A indústria também poderá inovar, fazendo aparelhos mais seguros, mais simples, fáceis de serem manuseados. É terrível para quem, como já me sinto fazendo, ser obrigado a ler com óculos nem sempre perfeitos indicações de teclas em letras pequenas, em inglês, letras escuras em fundo preto. Para a pessoa mais velha o óculos acaba virando companheiro inseparável. Qualquer prótese, contudo, não devolverá o potencial do jovem saudável. Ouvir, ver, cheirar, sentir, andar, usar os braços são funções que se complicam com a idade.
A presença do idoso na cidade é importante, é humano, é saudável para ele e para todos, que assim ganharão dinheiro com ele e aprenderão a ver a vida de forma mais profunda. As cidades, contudo, precisariam ter em seus órgãos de planejamento pessoas sensíveis a essa população. Tecnocratas instalados em cargos estratégicos muitas vezes carecem de compreensão para questões sociais dessa envergadura, e eles fazem normas, regras de projeto e construção, que acabam gerando calçadas intransitáveis, ruas perigosas, praças onde tudo tem vez, menos o ser humano.

JCC, 21.1.1

Manutenção predial

Na Engenharia o projeto e a construção dão placas, honrarias, publicidade. A manutenção é a filha renegada, desprezada. No entanto é essencial, condição importante para a segurança de pessoas e instalações.
O progresso científico e tecnológico criou novas formas de avaliação. Em muitos aparelhos de ensaio a diferença entre versões médicas e industriais é apenas a cor, os aparelhos para uso médico são pintados de branco.
Máquinas e estruturas podem ser avaliadas com muita precisão graças à uma coleção enorme de aparelhos, mas os computadores e microprocessadores foram o grande salto que agora permite análises antes impossíveis.
Tecnologia de materiais é uma das ciências modernas. Conhecer, avaliar, medir a qualidade e desempenho dos materiais que utilizamos é vital para a segurança de todos. Os grandes aviões só continuam voando porque desenvolveu-se técnicas espetaculares de inspeção. Os esforços que esses aparelhos suportam são enormes e só estruturas muito bem construídas e mantidas seriam capazes de oferecer tanta segurança.
E os prédios de apartamentos? Vivemos em cidades, moramos em apartamentos, em prédios cada vez mais altos, mais no limite de utilização de materiais. Eles são o produto da melhor engenharia e para continuarem com suas qualidades dependem de boa manutenção. Sistemas hidráulicos, elétricos, de comunicação e transporte, segurança elétrica, tudo deveria passar por inspeções e ensaios regulares.
É interessante ver como o cidadão comum despreza detalhes essenciais tão próximos, acidentes em banheiros e cozinhas são muito mais freqüentes do que se possa imaginar. E a qualidade de suas instalações?
O gás e a energia elétrica poderão ser altamente letais. Tudo dependerá da qualidade dos equipamentos que utilizarem essas fontes de energia. Não valeria a pena, de tempos em tempos, contratar especialistas para diagnósticos e ajustes?
Evidentemente tudo depende dos recursos existentes. Desde a capacidade do cidadão pagar por serviços de manutenção até a existência de profissionais competentes há um leque de condições importantes. Felizmente no Paraná temos excelentes profissionais. Aqui, para qualquer desafio técnico encontraremos bons profissionais. Dentro do que se exige para maior segurança e conforto em residências, prédios comerciais, fábricas e outras instalações será possível identificar laboratórios, empresas e profissionais preparados.

JCC, 21.1.1

Idosos, PPDs e terminais do transporte coletivo

Algo espantoso é a falta de atenção com as pessoas com necessidades especiais. Talvez nossas universidades, partidos políticos e clubes de serviço merecessem passar por um treinamento técnico e moral para orientações quanto à necessidade urgente de atenção para as pessoas portadoras de deficiências (PPDs).
Cinismo, hipocrisia ou pura ignorância, pode-se conjeturar sobre as causas da omissão, a verdade é que raramente observaremos detalhes de comportamento que apontem para o respeito aos idosos, surdos, cegos, paraplégicos, deficientes mentais e às próprias crianças.
Arquitetos e urbanistas famosos deram exemplos terríveis. Poucos poderão mostrar algo que denote atenção aos PPDs. Em Curitiba basta caminhar pelas ruas centrais para sentir que nem as calçadas são seguras para os andarilhos com alguma restrição motora ou sensorial. Sob o pretexto de preservar imagens antigas, mantêm-se padrões selvagens.
Exemplos brutais da falta de cuidado são os aeroportos e rodoviárias. Nesses locais a comunicação auditiva e visual é precaríssima, faltam lugares para descanso, o tratamento é ruim. Se os aeroportos estão se brutalizando, as rodoviárias estão em níveis péssimos de qualidade no atendimento aos seus usuários. Projetos antigos, lógicas frias e outras prioridades fazem do PPD uma pessoa abandonada e hostilizada direta ou indiretamente.
O resultado da ausência de cuidados é a opção pelo transporte individual. Quem pode despreza ônibus, aviões e as próprias cidades, pois nesses lugares públicos sabem que terão tratamento inadequado às suas necessidades.
A mudança de comportamento é difícil numa época em que o individualismo domina a lógica popular. Hábitos de cortesia dão lugar à agressividade, louvada e estimulada como qualidade de vencedores. Precisamos conciliar personalidades de modo a formar adultos sadios e capazes de lutar pela vida. A criação de uma ética da cidadania seria talvez a diretriz a ser adotada em nossas escolas do primeiro ao último grau.
Há muito a ser feito para a formação de cidades saudáveis. Lamentavelmente as entidades dedicadas aos PPDs normalmente se limitam a questões imediatas, pouco fazendo para a conquista e sustentação de direitos. A realidade, contudo, aponta para a necessidade de mobilização e ações a favor de ajustes mais do que necessários.
Talvez empresários e políticos não tenham ainda percebido a importância desse contingente humano crescente. A proporção de pessoas com necessidades especiais aumenta à medida que a expectativa de vida cresce e os remédios salvam, permitindo a vida para seres humanos que em outras épocas teriam morrido. Toda a ciência a favor da manutenção da vida biológica deveria ser acompanhada da cultura social, da atenção para a importância dessa gente dependente de poucos e extremamente importantes aprimoramentos. Seria maravilhoso podermos dizer que moramos numa cidade bela e justa.

Cascaes
Cba, 2002

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