sábado, 21 de junho de 2008

Do vermelho para o verde

O sentimento de nação apareceu muito tarde na história da humanidade. Salvo exceções raras que a memória confiável possa apontar entre alguns povos mais desenvolvidos, as pessoas se sentiam unidas por efeito de religiões ou sangue de famílias poderosas. Detalhes raciais definiam tribos e espécies humanas que em torno disso criavam ódios e amores, não existia, contudo, uma preocupação real entre pessoas em torno de fronteiras que considerassem sua terra em conseqüência do nascimento ou culto a conquistas geográficas. Os impérios eram propriedades de pessoas que se diziam herdeiras naturais ou conquistadoras à força de exércitos que amealhavam unindo tribos, mercenários ou seguidores de alguma seita.
O nascimento da consciência de pátria e nação veio na luta contra classes dominantes, criando-se a visão socialista à medida que burgueses e servos não suportaram mais a exploração excessiva de famílias de sangue azul.
Os ideais de igualdade, fraternidade e liberdade surgiram sob cores vermelhas e assim os esquerdistas foram rotulados até em nações que tiveram esses princípios como base de formação. Nos Estados Unidos da América do Norte a liberdade se confundiu com o direito ao uso pleno da propriedade privada, estimulando-se, aos poucos, sentimentos de rejeição total a qualquer proposta distributivista. A Guerra Fria foi o caldo em que cozinharam e derreteram muitos sentimentos de amor ao próximo. Paralelamente os esquerdistas foram identificados ao que havia de pior no império soviético...
No Brasil esse fenômeno ganhou força no último século.
Os anarquistas assustaram os donos de fazenda. Grandes proprietários de terras, muitas vezes conquistadas em bajulações ao imperador D. Pedro II ou simplesmente em registros de cartório, precisavam de trabalhadores que substituíssem a mão escrava, assim trouxeram imigrantes, gente que em sua maioria vivia miseravelmente em suas terras de origem ou formava uma classe de trabalhadores já consciente de seus direitos. O resultado foi a importação de anarquistas, socialistas, comunistas e uma multidão sem crenças políticas, mas cheia de esperanças que, em princípio, foram frustradas nas fazendas onde substituíram o trabalhador africano.
Ganhamos comunistas, socialistas e outros, todos ditos “vermelhos” por aqueles que temiam perder o poder conquistado ou herdado dos tempos anteriores. Chegamos aos anos sessenta do século passado, quando a reação ao período militar radicalizou pessoas que formataram partidos clandestinos, movimentos etc. Com a redemocratização na década de oitenta aos poucos os líderes identificados com a esquerda ganharam poder. Os vermelhos descobriram outras cores e agora vemos a opção verde da maioria. Verde não apenas no sentido ecológico, a maioria em torno de cédulas com qualidades monetárias.
Perda lamentável diante de cenários de empobrecimento, de maior exploração dos trabalhadores. De “gado” à disposição dos vendedores de escravos passaram a “mercado”, “mão de obra” etc, devidamente cooptados por sindicatos, partidos políticos, religiões e enganados em prosa e verso por toda espécie de liderança. Ganhamos preocupações esotéricas e esquecemos a necessidade de moradia, de saneamento básico, de educação e instrução. O que importa é combater produtos que dizem degradar a natureza, esquecendo-se que nossa natureza está sendo ameaçada pelos veículos que usam combustíveis fósseis, pelas doenças (nós somos parte da natureza), por inúmeras coisas onde se destacam a fome e a miséria de parte significativa da população, longe de qualquer benefício que a sociedade moderna oferece.
Precisamos rotular o lixo, talvez estejam comendo lixo transgênico.
Na transformação dos vermelhos em verdes estamos perdendo sensibilidade às prioridades reais da humanidade. Nosso meio ambiente é infinitamente mais agredido pela miséria do que pela riqueza e produtos que viabilizam a vida tecnológica. Os melhores exemplos de agressões ecológicas, ambientais etc estão na periferia de nossas cidades, onde as pessoas mais pobres invadem áreas de preservação ambiental, construindo seus barracos até sobre riachos que volta e meia enchem, matando seus filhos.
Podemos e devemos perguntar, será que o ser humano é racional? Onde estão os vermelhos? A realidade é isso? Não evoluiremos?

Cascaes
25.3.2006

Nenhum comentário: